terça-feira, 10 de março de 2015

2006, uma Copa chutada para o espaço - Parte 2

A estréia do Brasil foi contra a Croácia. Era a partida mais difícil da primeira fase, cercada pela tradicional tensão e nervosismo do primeiro jogo, que num quadrangular, de tiro curto, pode definir as condições para a classificação ou a eliminação. Ansiosa, a Seleção Brasileira não jogou bem, mas venceu, com um chute de Kaká, de fora da área, no finzinho do primeiro tempo. Na seqüência, o Brasil não teve muita dificuldade para ganhar da Austrália, 2 x 0, gols de Adriano e Fred, e do Japão, 4 x 1, com dois de Ronaldo. Dominante e primeiro no grupo, o Brasil seguia impávido e seguro, com uma soberba de favorito absoluto. E festejava, pois com os dois gols contra os japoneses, o atacante Ronaldo chegava a 14 gols em Copas do Mundo, igualando o recorde do alemão Gerd Muller, até então maior artilheiro das Copas, que fez 10 gols na Copa de 70 e 4 gols na Copa de 74. Mas não foi só, Ronaldo chegava a 66 gols com a camisa canarinho e igualava-se a Zico, segundo maior artilheiro da história do Brasil.

Na primeira fase, no “Grupo da Morte”, Argentina e Holanda impuseram a tradição de suas camisas, eliminando Sérvia e Costa do Marfim, esta última munida de Didier Drogba, que brilhava com a camisa do Chelsea no Campeonato Inglês. O Equador mostrou força e eliminou a Polônia. No grupo do Brasil, a surpreendente Austrália, que eliminara o Uruguai nas Eliminatórias, deixou a Croácia para trás e avançou.

Nas oitavas de final, o adversário do Brasil era o perigoso time de Gana. O Brasil tinha excelente retrospecto contra países africanos nas Copas do Mundo. Fez 3 x 0 no Zaire em 1974, 1 x 0 na Argélia em 1986, 3 x 0 em Camarões em 1994 e 3 x 0 em Marrocos de 1998. A vitória por três a zero era o placar marcante dos duelos dos canarinhos com os africanos. E foi o placar diante de Gana. Para manter a tradição de três gols nos confrontos de Copa contra africanos, na Copa seguinte, em 2010, a vitória sobre a Costa do Marfim foi por 3 x 1.

O resultado foi extremamente festivo. Ronaldo Fenômeno abriu o placar e com este gol tornou-se o maior artilheiro da história das Copas até então e o segundo maior da história da Seleção Brasileira. Adriano ampliou ainda no primeiro tempo. Zé Roberto fechou a conta no segundo tempo. Com quatro vitórias, o Brasil parecia sólido na sua rota para o seu sexto título mundial. Mas a partir das quartas de final só haveria pedreira no caminho de quem fosse erguer o troféu: Alemanha x Argentina, Brasil x França, Inglaterra x Portugal, e Itália e Ucrânia. Seis campeões mundiais entre os oito que haviam sobrevivido ao afunilamento. Dentre os que já haviam levantado a taça do mundo, só o Uruguai não se fazia presente.

Os alemães venceram os argentinos nos pênaltis e a Itália confirmou seu favoritismo diante dos ucranianos. Portugal, do treinador brasileiro Luiz Felipe Scolari, e dos craques Luís Figo e Cristiano Ronaldo, não saiu do zero contra os ingleses, mas também venceu nos pênaltis. Já o Brasil tinha pela frente a França, que o eliminara nas quartas na Copa de 86 e em cima de quem foi a campeã da Copa de 98 (os franceses também tinham derrubado o Brasil na Copa das Confederações de 2001). O último sucesso brasileiro sobre os franceses em Copas havia sido na semi-final de 1958. Hora de reverter este quadro de insucessos? Os titulares do Brasil estavam todos disponíveis: Dida, Cafu, Lucio, Juan e Roberto Carlos, Gilberto Silva, Juninho Pernambucano, Kaká e Ronaldinho Gaúcho, Adriano e Ronaldo.


O duelo era em Frankfurt. O time francês, treinado por Raimond Domenech, jogava com: Barthez; Sagnol, Thuram, Gallas e Abidal; Patrick Vieira, Makelele, Zinedine Zidane e Malouda; Frank Ribery e Thierry Henry. Era um grande time!

O primeiro tempo foi muito movimentado. Zidane estava magistral, como sempre, na condução do meio-campo francês. As maiores chances de gol de lado a lado surgiram em faltas nas respectivas intermediárias, mas nenhuma vez houve uma oportunidade que tenha deixado a respiração de qualquer torcedor presa, naquele sentimento de “quase!”. No início do segundo tempo, também num cruzamento para a área, Henry tocou de cabeça e fez os torcedores prenderem o ar no primeiro sentimento de “quase!”. Logo depois não teve escapatória. O relógio marcava 11 minutos, Zidane novamente teve a chance de cobrar uma falta na intermediária para dentro da área. Henry penetrou por trás da defesa e escorou para as redes. Gol! Aos 15, os franceses quase ampliaram. Aos 24, Dida saiu da área e se atirou com o corpo para matar o contra-ataque e salvar novamente a seleção. A chance real do time canarinho só veio aos 42. Ronaldo fez excelente jogada individual na entrada da área e foi derrubado, Ronaldinho Gaúcho cobrou e a bola passou triscando o travessão. Fim de jogo: França 1 x 0 Brasil.

Muito provavelmente foi a chance de título mais desperdiçada de todas, pois em nenhuma outra o nível técnico dos onze brasileiros esteve tão acima dos demais concorrentes. A torcida e a imprensa fizeram a tradicional caça ao culpado, e crucificaram Roberto Carlos, que no lance do gol, não prestou atenção e ficou ajeitando o meião, não acompanhando Henry, que penetrou sem marcação para escorar para o gol. Mas foram muitos os motivos do fracasso. Faltou seriedade e concentração, faltou liderança e disciplina. O hotel sempre esteve sob ambiente festivo e não com a seriedade que uma Copa do Mundo exige. Os jogadores abusavam, com consumo de champaigne durante as folgas. Faltou pulso a Carlos Alberto Parreira também, sob o comando de Luiz Felipe Scolari, por exemplo, certamente teria havido mais restrições às festividades fora de hora. Zagallo, auxiliar-técnico de Parreira, já estava com 75 anos, já não tinha a mesma energia, e não conseguia repetir o papel exercido em outrora.

A maior frustração de todas foi Ronaldinho Gaúcho. Não que tenha jogado mal, mas não conseguiu ser o protagonista a nível de Pelé e Maradona que se esperava dele. Nunca mais ousaram, nem imprensa nem torcida, colocá-lo de novo no mesmo patamar destes dois. Ao mesmo tempo, Ronaldo já começava a fase de luta contra a balança que marcou a fase final de sua carreira. E Adriano já havia começado a manifestar os problemas com as bebidas alcoólicas que o levaram a encerrar a carreira precocemente. O “Quadrado Mágico” fracassou!


Na semi-final, a Itália desbancou a Alemanha, dona da casa, vencendo por 2 x 0 na prorrogação. E a França superou Portugal por 1 x 0. Na final, no histórico jogo em que Zidane acertou uma cabeçada no peito do zagueiro Marco Materazzi e recebeu cartão vermelho. Os franceses saíram na frente, logo no início do jogo, mas logo cederam o empate. Os gols foram dos dois protagonistas da circense cena de agressão; Zidane foi expulso e os italianos venceram nos pênaltis e conquistaram pela quarta vez a Copa do Mundo. Se na Copa da Itália em 1990 foi a Alemanha que saiu campeã, na Copa da Alemanha em 2006 foi a Itália campeã.

O time titular dos campeões, treinados por Marcello Lippi, jogava com: Buffon; Zambrotta, Fabio Cannavaro, Materazzi e Fabio Grosso; Gattuso, Andrea Pirlo, Perrotta e Camoranesi; Francesco Totti e Luca Toni.

A seleção de melhores da Copa de 2006 eleita pela FIFA ficou assim: Gianluigi Buffon (Itália), Gianluca Zambrotta (Itália), Fabio Cannavaro (Itália), John Terry (Inglaterra) e Philipp Lahn (Alemanha), Patrick Vieira (França), Andrea Pirlo (Itália), Zinedine Zidane (França) e Michael Ballack (Alemanha), Thierry Henry (França) e Miroslav Klose (Alemanha). Nenhum brasileiro! Poderia ser algo natural, não estivesse aquela seleção de 2006 tão dominante no cenário internacional. Na lista dos 23 melhores da Copa divulgada pela FIFA, apenas Zé Roberto apareceu.

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