Jornal paraguaio El Comercio: Ganhamos porque fomos melhores
O ano de 1953 foi bastante especial para a história do futebol paraguaio. Até então, o selecionado guarani havia chegado à fase decisiva do maior torneio do continente em quatro oportunidades. No entanto, o sonho de sentir nas mãos o peso da cobiçada taça do Campeonato Sul-Americano, atualmente conhecido como Copa América, acabou adiado por brasileiros, em 1922 e 1949, e argentinos, em 1929 e 1947.
Com duas medalhas de prata obtidas de modo consecutivo, sendo a última delas colocada no peito após uma desmoralizante goleada de 7 a 0 diante do Brasil, os paraguaios já se encontravam ávidos para finalmente alcançar a glória redentora. A chance de ouro veio em 1953, justo quando o país deveria abrigar a 22ª edição do certame continental, entre os dias 22 de fevereiro e 1º de abril.
Devido a problemas relacionados à infraestrutura, contudo, a sede precisou ser transferida para o Estádio Nacional de Lima, na capital do Peru, sob a responsabilidade da Associação Paraguaia de Futebol (APF). Participaram da disputa, além de organizadores e anfitriões, as seleções de Brasil, Uruguai, Chile, Bolívia e Equador.
Colômbia e Argentina, por outro lado, decidiram ausentar-se, sendo que a equipe nacional alviceleste, por desavenças entre AFA e CBD, já não havia participado da competição anterior, em 1949, no Brasil. Quanto ao sistema de disputa, a regra permanecia idêntica, com turno único e um jogo extra para definir o campeão em caso de empate.
Assim, em 22 de fevereiro, o Peru protagonizou a partida inaugural contra a Bolívia, mas decepcionou o público local ao perder por 1 a 0. No dia 25, o Paraguai, então atual vice-campeão, teve o Chile como adversário. O time guarani, sob o comando do técnico Manuel Fleitas Solich, conhecido também pelo apelido de “El Brujo”, obteve uma tranquila vitória por 3 a 0, com dois gols de Rubén Fernández e um de Ángel Berni.
Em 1º de março, foi a vez de o Brasil ir a campo diante da Bolívia para iniciar a defesa do título conquistado quatro anos antes, no Estádio de São Januário. Com um elenco respeitável, do qual faziam parte Castilho, Djalma Santos, Nílton Santos, Didi, Zizinho, Cláudio, Julinho e Baltazar, por exemplo, o primeiro compromisso em terras peruanas foi bastante confortável: 8 a 1, com seis gols nos 45 minutos iniciais.
Após a estreia tranquila, o Paraguai complicou-se ao empatar os três jogos subsequentes. Em 4 de março, a equipe não saiu do zero com o Equador, seleção que não venceria nenhuma partida no campeonato. No dia 8, empatou por 2 a 2 com o Peru, novamente com gols de Fernández e Berni. Mas os “incas” ganharam os pontos em função da conduta antidesportiva do adversário, que realizou uma substituição irregular.
Quatro dias depois, o Paraguai repetiu a igualdade diante do Uruguai, com gols de Berni e Atilio López. Por sua vez, o Peru – que havia se reabilitado com uma vitória simples sobre o Equador – empatou sem gols com o Chile, que havia batido o sempre perigoso Uruguai por 3 a 2.
A sina de resultados iguais acabou quando o Brasil voltou a atuar, em 12 de março. O escrete dirigido pelo técnico Zezé Moreira superou o Equador por 2 a 0, com tentos de Ademir e Cláudio. No dia 15, venceu o Uruguai pelo placar mínimo graças a Ipojucan, talentoso meia-atacante do Vasco da Gama, isolando-se assim na ponta da tabela.
O cenário, neste momento, começou a se inverter. Em 16 de março, o Paraguai superou a Bolívia por 2 a 1, gols de Romero e Berni. Já o Brasil, três dias depois, não esteve à altura do Peru e caiu por 1 a 0. A situação quase piorou para os brasileiros no jogo seguinte, em 23 de março, mas a seleção obteve uma vitória por 3 a 2 sobre o Chile, com gols de Julinho, Baltazar e Zizinho.
Conforme passavam as rodadas, cada vez faltava menos para o encontro entre Brasil e Paraguai, que disputavam a ponta da tabela. O confronto ocorreu no dia 27 de março. O início dele foi bastante favorável ao Brasil, que havia largado na frente com 12 minutos, fruto de uma investida de Nilton Santos. A vantagem continuou até o início do segundo tempo, quando Atilio López deixou tudo igual na cidade de Lima.
A cinco minutos do fim, quando o jogo caminhava para um empate que garantiria o primeiro lugar ao Brasil, o Paraguai renasceu. E é neste momento que surge a curiosa história de Pablo León. O jogador, que ainda não havia participado de uma partida sequer, substituiu Atilio Lopez, um dos goleadores da equipe, e logo depois marcou o gol da vitória. Com isso, os paraguaios empatavam com o Brasil em número de pontos.
Àquela altura, o maior problema dos guaranis era a seleção do Peru, que tinha um ponto a menos e iria encarar o Uruguai no dia seguinte, com chances de definir o título. Mas os uruguaios, mesmo sem chances de ganhar o campeonato, pressionaram o rival inca e conquistaram uma vitória por 3 a 0, forçando uma partida extra entre Brasil e Paraguai.
Empolgado, o time de “El Brujo” buscava sua revanche e o primeiro título da história do país, além da oportunidade de consagrar uma ótima geração. Enquanto isso, o Brasil ainda sofria e desejava amenizar a fresca memória do Maracanazo. Assim era o clima vivido pelas duas seleções antes da grande final, que foi marcada para 1º de abril, uma quarta-feira de Semana Santa.
Com a mesma escalação do encontro anterior, o Paraguai teve um início arrasador. Aos 14 minutos, Atilio López converteu o primeiro. Pouco depois, Gavilán ampliou a diferença, ao passo que Rubén Fernández deixou a situação mais confortável antes do intervalo. Apesar da vantagem por 3 a 0, o jogo não foi tranquilo, porque Baltazar recolocou o Brasil em jogo ao anotar dois gols em 15 minutos.
Viva, a seleção brasileira se lançava inúmeras vezes ao ataque na tentativa de furar a meta defendida por Adolfo Riquelme, mas o arqueiro demonstrou habilidade ao conter todos os chutes inimigos. A pressão aumentava, mas as investidas não foram suficientes para alterar o destino da partida. O Paraguai teve sua revanche, ainda que não da mesma forma de 1949, e sentiu, longe de casa, o inigualável sabor da volta olímpica.
Escalação da final:
PARAGUAI: Riquelme; Olmedo, Herrera e Gavilán; Leguizamón e Hermosilla; Berni, López (Parodi) e Fernández; Romero (Lacasa) e Gómez (Martínez).
BRASIL: Castilho; Djalma Santos e Haroldo; Nilton Santos (Alfredo Ramos), Bauer e Brandãozinho; Julinho Botelho, Baltazar, Pinga (Ipojucan), Didi e Cláudio Pinho.
Fonte: www.alambrado.net/o-ano-da-redencao-paraguaia/
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