quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

O fracasso brasileiro na África do Sul

A 19ª Copa do Mundo de futebol foi disputada pela primeira vez na África. O Brasil queria manter seu status de única seleção até então na história a ter conquistado Copas fora de seu continente, pois assim foi em 1958 na Suécia e em 2002 na Coréia do Sul e no Japão.

As Eliminatórias não reservaram grandes surpresas. O Uruguai, como se tornou rotina, jogou a repescagem, mas eliminou a Costa Rica e garantiu sua classificação. Na Europa, França e Portugal também foram à repescagem, eliminaram respectivamente a Irlanda e Bósnia, e também se garantiram na África do Sul.

As 32 seleções foram divididas em 8 grupos. No Grupo A estavam França, Uruguai, México e África do Sul. Num grupo equilibrado, os dois latino-americanos conseguiram a classificação, os franceses empataram na estréia com os uruguaios e depois só perderam, dando um adeus prematuro. No Grupo B estavam Argentina, Grécia, Nigéria e Coréia do Sul; favoritos, os argentinos não tiveram muita dificuldade. No Grupo C estavam Inglaterra, Eslovênia, Estados Unidos e Argélia, e o Grupo D era formado por Alemanha, Sérvia, Gana e Austrália. No Grupo E estavam Holanda, Dinamarca, Camarões e Japão. O Grupo F tinha Itália, Eslováquia, Paraguai e Nova Zelândia, e também teve adeus prematuro de campeões mundiais. Os italianos empataram com paraguaios e neozelandeses e perderam dos eslovacos. O Grupo G tinha Brasil, Portugal, Costa do Marfim e Coréia do Norte. E no Grupo H estavam Espanha, Suíça, Chile e Honduras.

O Brasil fez bem poucos jogos preparatórios. Em novembro de 2009 jogou duas vezes no Oriente Médio, sendo o primeiro, o único jogo da preparação que exigiu mais da seleção canarinho, uma vitória por 1 x 0 sobre a Inglaterra. Depois venceu Omã, um país que nunca havia disputado uma Copa do Mundo, por 2 x 0. Em março, venceu o Eire por 2 x 0. E para fechar, às vésperas do Mundial, já em solo africano, venceu com facilidade a Zimbábue (3 x 0) e Tanzânia (5 x 1), dois países que também nunca haviam estado numa Copa do Mundo. Repetindo 2006, quando também fez poucos jogos preparatórios antes do principal evento futebolístico do calendário mundial, foi assim que a Seleção Brasileira se preparou para fazer sua estréia, que era contra a Coréia do Norte.

Se foram poucas oportunidades para aperfeiçoar o entrosamento da equipe que entraria em campo para representar o Brasil, foram suficientes para definir um novo nome para a posição com a qual Dunga estava menos satisfeito, a lateral-esquerda. Michel Bastos chegou e se firmou como titular da posição. Ele era pouco conhecido no Brasil, de onde saiu aos 18 anos de sua cidade-natal, Pelotas, no Rio Grande do Sul, para defender o Feyenoord, da Holanda. Voltou ao Brasil três anos depois e passou por Atlético Paranaense, Grêmio e Figueirense. Aos 23 anos voltou para a Europa, tendo defendido primeiro o Lille e depois o Lyon, na França, onde conseguiu as atuações que o levaram a vestir a camisa verde e amarela. Depois da Copa ainda veio a defender ao Schalke 04, da Alemanha, e à Roma, da Itália, mas jamais sem conseguir o destaque que conseguiu naquela temporada de 2010.

Na lista final para o Mundial, a grande crítica da mídia esportiva era pela ausência das duas jovens revelações do Santos, o meia Paulo Henrique Ganso e o atacante Neymar. O treinador preferiu optar por jogadores mais experientes. E assim foram definidos os 23 convocados por Dunga para a Copa 2010:

Goleiros: Júlio César (Internazionale, Itália), Doni (Roma, Itália) e Gomes (Tottenham, Inglaterra)
Laterais: Maicon (Internazionale, Itália), Daniel Alves (Barcelona, Espanha), Michel Bastos (Lyon, França) e Gilberto (Cruzeiro)
Zagueiros: Lúcio (Internazionale, Itália), Juan (Roma, Itália), Thiago Silva (Milan, Itália) e Luisão (Benfica, Portugal)
Meias: Gilberto Silva (Panathinaikos, Grécia), Josué (Wolfsburg, Alemanha), Felipe Melo (Juventus, Itália), Kléberson (Flamengo), Elano (Galatasaray, Turquia), Ramires (Benfica, Portugal), Kaká (Real Madrid, Espanha) e Júlio Baptista (Roma, Itália)
Atacantes: Robinho (Santos), Luís Fabiano (Sevilla, Espanha), Nilmar (Villarreal, Espanha) e Grafite (Wolfsburg, Alemanha).


A estréia da Seleção Brasileira foi com uma vitória absolutamente sem brilho sobre os norte-coreanos. Os onze titulares de Dunga estiveram definidos desde o início: Júlio César, Maicon, Lúcio, Juan e Michel Bastos, Gilberto Silva, Felipe Melo, Elano e Kaká, Robinho e Luís Fabiano. Apesar do frágil adversário, o primeiro tempo da estréia não teve gols, que só vieram no segundo tempo. O primeiro foi um golaço. Aos 10 minutos, Maicon recebeu em profundidade e quase sobre a linha de fundo acertou um tirambaço, que passou entre o goleiro e a trave. Aos 27, Robinho fez lançamento preciso para Elano por trás da zaga, ele penetrou e tocou na saída do goleiro. No último minuto, Ji Yun Nam entrou com facilidade driblando a defesa brasileira e fez um bonito gol, descontando e pondo o 2 x 1 definitivo no marcador.

O segundo jogo era com a sempre difícil Costa do Marfim. O Brasil quase repetiu o tradicional placar de 3 x 0 sobre países africanos em Copas do Mundo. Fez três, duas vezes com Luís Fabiano, e outra com Elano. Aos 17 do segundo tempo, os 3 x 0 já estavam postos no placar. Mas Didier Drogba fez o gol de honra aos 34. Brasil 3 x 1. No outro jogo da rodada, Portugal impôs à Coréia do Norte a maior goleada daquele Mundial, com uma vitória por 7 x 0.

Com duas vitórias, a Seleção Brasileira já estava classificada, mantendo a tradição, afinal no período pós-Segunda Guerra Mundial, em 16 edições da Copa do Mundo até então, o Brasil só havia sido eliminado na primeira fase uma única vez, em 1966.

Na última rodada, brasileiros e portugueses avançavam com um empate. Sem motivações de parte a parte para assumir riscos, o jogo ficou no empate sem gols. O time canarinho avançou em primeiro lugar, mas jogando um futebol bucólico e sem brilho. O adversário nas oitavas de final era mais uma vez o Chile, a quem a seleção também havia enfrentado na mesma fase na Copa de 98. E como daquela vez, avançou sem muita resistência, 3 x 0, gols de Juan, Luís Fabiano e Robinho.

Nas quartas de final, só haveria grandes jogos: Brasil x Holanda, Alemanha x Argentina, Espanha x Paraguai, e Uruguai x Gana. Os espanhóis eram os campeões europeus, mas os dois considerados favoritos àquela altura, por estarem jogando um futebol mais vistoso, eram argentinos e alemães, o duelo mais aguardado daquelas quartas. De um lado, o time treinado por Diego Armando Maradona, e com um poderoso comando de ataque, com Di Maria, Tévez, Messi e Higuain. Do outro, um time que vinha jogando um futebol compacto, rápido, tecnicamente refinado e bastante eficiente. A Alemanha, treinada por Joachim Low, e cuja formação titular era: Neuer; Philipp Lahm, Mertesacker, Friedrich e Jerome Boateng; Khedira, Schweinsteiger, Ozil e Thomas Muller; Podolski e Miroslav Klose. Os alemães mostraram porque eram a sensação do torneio e golearam implacavelmente por 4 x 0 aos argentinos.

Já a Seleção Brasileira tinha pela frente o fortíssimo time holandês, com Wesley Sneijder brilhando no meio-campo como um clássico camisa 10, e uma forte dupla de ataque, com Robben e Van Persie. Historicamente, o duelo teve a Holanda derrubando o Brasil nas semi-finais da Copa de 1974, e o Brasil derrubando os holandeses duas vezes seguidas, nas quartas da Copa de 1994 e na semi-final da Copa de 1998.

O jogo, como não poderia deixar de ser, foi disputadíssimo. Robinho abriu o marcador logo aos 10 minutos do primeiro tempo, quando um lançamento preciso de Felipe Melo o pôs frente a frente ao goleiro para completar de primeira e superá-lo. O time brasileiro fez um bom primeiro tempo e parecia caminhar para a vaga.

Veio o segundo tempo. E logo aos sete minutos tudo mudou. Mudança que começou num lance despretensioso. Sneijder cruzou para a área, Júlio César saiu muito mal do gol, chocando-se com Felipe Melo, que subia para tentar cortar. A bola chegou a dar uma leve resvalada na cabeça do meio-campista brasileiro. Com a trapalhada defensiva do Brasil, o cruzamento de Sneijder foi direto para dentro das redes. Tudo igual.

A partir daí, a seleção demonstrou nervosismo e rispidez, deixando de lado o bom futebol do primeiro tempo e passando a fazer um jogo mais truculento e feio, recheado de faltas. O controle do jogo passou a ser todo holandês. Treze minutos depois de obter o empate, o time laranja virou. Após cobrança de escanteio, Sneijder, novamente ele, testou para as redes. Holanda 2 x 1 Brasil. A Seleção Brasileira teve vinte e dois minutos para empatar o jogo, mas emocionalmente abalada, foi incapaz de reagir.


A Holanda avançou e superou o Uruguai na semi-final. Foi para a final contra a Espanha, que bateu a Alemanha por 1 x 0. Depois de 80 anos desde a realização da primeira Copa do Mundo, pela primeira vez outro país que não o Brasil saberia o que seria ganhar um Mundial fora de seu continente, e numa final inédita, entre duas seleções que nunca haviam sido campeãs antes. A Espanha venceu na prorrogação, após empate sem gols no tempo normal. Foi de Andrés Iniesta, a quatro minutos do fim do segundo tempo da prorrogação, o gol que selou o título espanhol.

Os escolhidos pela FIFA como time ideal daquele Mundial: Iker Casillas (Espanha), Maicon (Brasil), Sérgio Ramos (Espanha), Carles Puyol (Espanha) e Philipp Lahn (Alemanha), Schweinsteiger (Alemanha), Iniesta (Espanha), Sneijder (Holanda) e Thomas Muller (Alemanha), Diego Forlán (Uruguai) e David Villa (Espanha).

O Clube dos Campeões Mundiais

A Copa de 2010 consagrou definitivamente a “Revolução Espanhola”, o "tiki-taka", um novo estilo de jogar futebol aperfeiçoado no Barcelona a partir de 2007 pelo treinador Pep Guardiola e que rendeu muito bons resultados à equipe catalã. Como metade da seleção espanhola era composta por jogadores do Barcelona, foi inevitável que aos poucos este estilo fosse transmitido para o selecionado nacional. E rendeu bons frutos, pois a Espanha foi Bi-campeã da Eurocopa em 2008 e 2012 e campeã da Copa do Mundo de 2010.

O estilo de jogo trazido pelo espanhóis consistia em intensa movimentação e troca de posições entre o meio de campo e o ataque. A figura de um centroavante, preso à área adversária, praticamente desapareceu, com o time adotando uma formação em 4-6-0. A principal característica era ter intensamente a posse de bola, trocando passes pacientemente até encontrar espaços na formação defensiva do adversário. O meio de campo também praticamente perdia a figura de especialistas apenas em contenção, todos marcavam e atacavam. O futebol mundial vinha sendo dominado pela força física e por jogadores fortes, mas a Espanha reverteu isto, jogando um futebol de mais leveza, onde predominavam jogadores habilidosos e de estatura mais baixa.

Em 2008, venceram a Eurocopa com Luis Aragonês como treinador, e tendo como time tuitular a: Casillas; Sérgio Ramos, Puyol, Marchena e Capdevila; Marcos Senna, Xavi, Iniesta e Fábregas; David Villa e Fernando Torres. Xavi, Iniesta e Fábregas eram a chave, com um estilo de jogo que os fazia ora serem cabeças de área, ora serem meias armadores, e ainda com desenvoltura para chegar ao ataque e concluir a gol. Neste time, Fernando Torres ainda fazia o típico centroavante. E a equipe ainda tinha a David Silva - que constantemente se revezava com Cesc Fábregas - como um tradicional camisa 10.

Na Copa de 2010, o time era treinado por Vicente Del Bosque, e os onze titulares campeões: Casillas; Sérgio Ramos, Puyol, Piqué e Capdevila; Busquets, Xavi, Iniesta e Xabi Alonso; Pedro e David Villa. A equipe ainda tinha Fernando Torres se revezando com David Villa no comando de ataque, e ainda mantendo a figura de um homem de área, especialista apenas em concluir a gol.

Na Euro 2012, ainda com Del Bosque como treinador, o time foi campeão jogando com: Casillas; Arbeloa, Sérgio Ramos, Piqué e Jordi Alba; Busquets, Xavi, Iniesta, Xabi Alonso, David Silva e Fábregas. Não havia atacantes. Busquets era o único a só marcar, os demais defendiam, armavam, atacavam e invertiam posições constantemente.

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