sábado, 5 de julho de 2014

A Copa América de 1989

Os resultados da seleção de Sebastião Lazaroni no primeiro semestre foram ruins, e a desconfiança para a disputa da Copa América era enorme.

No primeiro amistoso do ano, reunindo só jogadores que estavam atuando no país, uma vitória magra por 1 x 0 sobre o Equador, em Cuiabá. Depois o time embarcou para o exterior, onde perdeu para a Seleção do Mundo da FIFA por 2 x 1 em Udine, e venceu ao Al Ahli, clube da Arábia Saudita, por 3 x 1, em Jeddah.

Na seqüência, vitórias sobre o Paraguai, em Teresina, e o sobre o Peru, em Fortaleza. Depois, um empate com o Peru em Lima, e uma goleada por 4 x 0 sobre Portugal no Maracanã. Até então um trabalho ainda sem brilho, mas também sem muita margem para contestações.

Veio então uma excursão à Escandinávia, na qual o Brasil perdeu por 2 x 1 para a Suécia e foi goleado pela Dinamarca por 4 a 0. O time dinamarquês tinha a mesma base que havia brilhado na Copa de 86, com Morten Olsen na defesa e Michael Laudrup comandando o meio, acrescida do jovem irmão caçula de Michael, o atacante Brian Laudrup. Eles acabaram com o Brasil naquele dia! Na seqüência, a Seleção Brasileira ainda perdeu por 1 x 0 para a Suíça (única derrota para os suíços em toda a história) e empatou sem gols com o Milan, da Itália. Foi uma viagem catastrófica. Se esta excursão não tivesse sido tão próxima à Copa América, teria custado a cabeça de Lazaroni.

O time de Lazaroni ainda estava em formação. O goleiro vinha sendo Acácio, do Vasco. Na lateral direita, as opções eram Jorginho, do Flamengo, ou Paulo Roberto, do Vasco. Na esquerda, três opções vinham sendo testadas: Branco, então no Porto, de Portugal, Mazinho, do Vasco, e Eduardo, do Fluminense. Na zaga, o único titular absoluto era André Cruz, da Ponte Preta; a seu lado foram testados Aldair, do Flamengo, Ricardo Gomes, do Benfica, de Portugal, Mauro Galvão, então no Botafogo, e Mozer, do Olimpique, da França. Destas onze opções para a defesa, dez ou tinham origem ou estavam no futebol carioca, André Cruz era a única exceção. Esta concentração nas escolhas atiçou ainda mais as críticas a Lazaroni.

No meio, os titulares até então eram Bernardo, do São Paulo, Silas, do Sporting, de Portugal, e Edu Manga, do Palmeiras. Mas foram testados: Cristóvão Borges, do Grêmio, e Zé do Carmo, Geovani e Bismarck, estes três do Vasco, Valdo, do Benfica, Zinho, do Flamengo, e Zé Carlos, do Bahia. E no ataque: Renato Gaúcho, da Roma, da Itália, Bebeto, do Flamengo, Charles Baiano, do Bahia, Gérson, do Atlético Mineiro, e o ponta-esquerda João Paulo, do Guarani.

Na lista de escolhidos para jogar a Copa América, algumas mudanças de última hora foram conseqüência desta má campanha em solo europeu, incluindo pela primeira vez a mudança que seria a marca de Lazaroni na seleção, a utilização de três zagueiros. Os titulares escolhidos para a competição foram: Taffarel (Internacional), Mazinho (Vasco), Aldair (Flamengo), Mauro Galvão (Botafogo), Ricardo Gomes (Benfica, Portugal) e Branco (Porto, Portugal), Dunga (Fiorentina, Itália), Silas (Sporting, Portugal) e Valdo (Benfica, Portugal), Bebeto (Flamengo) e Romário (PSV Eindhoven, Holanda). Os reservas eram: Acácio (Vasco), Josimar (Sevilla, Espanha) e André Cruz (Ponte Preta), Alemão (Napoli, Itália), Cristóvão (Grêmio), Geovani (Vasco) e Tita (Pescara, Itália), Renato Gaúcho (Roma, Itália), Baltazar (Atlético de Madrid, Espanha) e Charles (Bahia).


Os três primeiros jogos da Seleção Brasileira foram em Salvador, com uma vitória por 3 x 1 sobre a Venezuela (considerada muito magra por mídia e torcedores) e dois empates sem gols com Peru e Colômbia. Estes jogos acabaram marcados pelas vaias da torcida baiana, que exigia o centroavante Charles, ídolo local, como titular. Ele não entrou em campo em nenhum dos três jogos.

A situação brasileira ficou incômoda. O Paraguai venceu seus três jogos e fez 6 pontos. O Brasil tinha 4, seguido pela Colômbia com 3 e o Peru com 2 pontos. Peruanos e colombianos se enfrentavam. O Brasil mudava de sede no último jogo, enfrentando o Paraguai em Recife. Como dois avançavam à fase final, um empate brasileiro e uma vitória colombiana poderiam eliminar o Brasil logo na 1ª fase. Sob forte apoio da torcida pernambucana, o Brasil não conseguiu sair do zero a zero no primeiro tempo. A sorte começou a mudar logo aos 2 minutos do 2º tempo, quando Bebeto abriu o placar. Ele mesmo ampliou aos 37 e sacramentou a vaga no Quadrangular Final, no qual Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai se enfrentariam no Maracanã, no Rio de Janeiro.

O primeiro jogo do quadrangular já era uma pedreira, a Seleção Brasileira tinha pela frente a Argentina, com Maradona, Burruchaga e Caniggia. Foi quase uma final antecipada, numa noite de quarta-feira na qual o Maracanã recebeu 110 mil pessoas para ver uma rodada dupla, que começou com vitória arrasadora de 3 x 0 do Uruguai sobre o Paraguai. No jogo principal, brasileiros e argentinos fizeram um primeiro tempo tenso e sem gols, mas bastante movimentado. Logo no início do segundo tempo, uma obra prima de Bebeto, que, aos três minutos, tem uma bola ajeitada a meia altura, e acerta um lindo voleio, sem chance para o goleiro Pumpido. Brasil 1 a 0. O jogo ainda assim seguiu duríssimo, Maradona era uma ameaça constante. O Brasil só respirou aliviado aos 20 minutos, quando Romário fez 2 x 0.

Dunga vs Maradona, duelo na Copa América de 1989 no Maracanã

Dois dias depois, numa noite de sexta-feira, as 64 mil pessoas que estavam no Maracanã viram Maradona acertar o travessão num chute próximo à linha do meio de campo na preliminar, em que seu time perdeu por 2 x 0 para o Uruguai, com dois gols de Ruben Sosa. No jogo principal, Brasil 3 x 0 Paraguai, sem muita dificuldade, dois gols de Bebeto e um de Romário. A dupla de ataque brasileira estava infernal!

Domingo, 16 de julho, o Maracanã recebeu um público de 133 mil pessoas. No ar, o fantasma do Maracanazo de 1950. O forte time uruguaio tinha como sua principal estrela a Enzo Francescoli, também tinha a garra de Hugo De León na zaga, os craques Ruben Paz e Ruben Sosa, além do perigoso Alzamendi.

Um jogo duríssimo e sofrido, foi se arrastando num tenso empate sem gols. Até que veio a bola do jogo, um contra-golpe que começou pelo lado direito de ataque do Brasil, com o improvisado Mazinho, lateral-esquerdo de origem. Ele avançou ao fundo e cruzou, o goleiro Zeoli tentou sair de soco, mas o baixinho Romário se antecipou e, abaixando a cabeça, tocou para o gol. Explosão de alegria! Jogo sofrido até o minuto final. O juiz apita o fim de jogo e o Brasil grita “Campeão!”, um grito entalado desde 1970.

Foi tão só a 4ª vez que o Brasil conquistou o título continental, a última vez tinha sido 40 anos antes, em 1949, quando também foi sede do torneio.


Ficha Técnica
BRASIL 1 x 0 URUGUAI
Gol: Romário (4'2T)

BRASIL: Taffarel; Mazinho, Aldair, Mauro Galvão, Ricardo Gomes e Branco; Dunga, Silas (Alemão) e Valdo; Bebeto e Romário.

URUGUAI: Zeoli; Nelson Gutiérrez, Hugo De León e Alfonso Domínguez; José Herrera, José Perdomo, Santiago Ostolaza (Ruben Silva), Enzo Francescoli e Ruben Paz (Carlos Correa); Alzamendi e Ruben Sosa.


Não houve tempo para respirar. Duas semanas depois da conquista da Copa América, a Seleção Brasileira iniciava sua luta nas Eliminatórias. Eram três grupos de três, já que a Argentina, então campeã do mundo, já estava automaticamente classificada para o Mundial. O grupo brasileiro tinha Venezuela e Chile.

Os comandados de Sebastião Lazaroni não tomaram conhecimento da Venezuela, vitórias por 4 x 0 em Caracas e por 6 x 0 em São Paulo. Já contra o Chile, a parada era bem mais dura. O atacante Careca, do Napoli, da Itália, substituiu a Romário no comando de ataque. Em Santiago, empate por 1 x 1. O jogo de volta era no Rio de Janeiro e para o Brasil o empate bastava. No Maracanã havia um público de 141 mil pessoas. Careca, aos 4 minutos do segundo tempo, pôs 1 x 0 para o Brasil no placar.

Vinte minutos após o gol, um foguete sinalizador caiu dentro de campo, atirado pela torcida brasileira. O goleiro Rojas caiu na área, e ao se aproximarem, o árbitro e seus companheiros o encontraram ensangüentado. Os jogadores chilenos o carregaram para fora de campo e se retiraram da partida, que foi dada por encerrada.   

A torcedora responsável pelo disparo foi imediatamente identificada e detida por policiais, seu nome: Rosenery Mello. O incidente explicitava uma falta gravíssima de segurança no estádio. Ninguém sabia quais seriam as conseqüências.

No dia seguinte, uma foto em primeira página no jornal carioca O Globo mostrava claramente que o rojão sinalizador havia caído longe do arqueiro chileno. No mesmo dia apareceu uma imagem de televisão flagrando que Rojas retirou uma lâmina de barbear de dentro da luva e a passou em seu supercílio, iniciando o sangramento. O tribunal da FIFA recebeu todas as provas e intimou os envolvidos a deporem. Dois chilenos - ambos jogavam no Brasil - assumiram a premeditação da farsa: o goleiro Roberto Rojas, do São Paulo, e o zagueiro Fernando Astengo, do Grêmio, não contavam com o foguete, só aproveitaram a oportunidade. Segundo os dois, a idéia era simular uma pedrada, para, sob a alegação de falta de segurança, forçar uma nova partida em campo neutro. A FIFA declarou WO em favor do Brasil por abandono de campo (placar oficial de 2 a 0), baniu Rojas e Astengo, e suspendeu o Chile por quatro anos de competições oficiais.




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