Para a 21ª Copa do Mundo de futebol disputada na Rússia, o Brasil chegava recuperado emocionalmente da traumática derrota para a Alemanha em 2014. Desde que assumiu o comando da equipe nacional, o técnico Tite emplacou uma sequência muito positiva de resultados, fazendo o país voltar a acreditar no potencial de sua seleção. Nos dois amistosos que antecederam à Copa do Mundo, jogando na Europa, vitórias convincentes sobre Croácia (2 x 0) e Áustria (3 x 0). O desempenho de Tite a frente daquele grupo, até aquele momento, era espetacular: em 21 jogos, havia obtido 17 vitórias, 3 empates e apenas 1 derrota (num amistoso contra a Argentina). Entre as vitórias, resultados bastante convincentes nas Eliminatórias sobre Argentina e Uruguai (goleada por 4 x 1 em plena Montevidéu), além de vencer amistosos com Alemanha, Rússia e Croácia, esta última que viria a ser finalista no Mundial 2018, e ainda obter um empate frente à Inglaterra. Os adversários nos amistosos não eram fracos e inexperientes, e os resultados indicavam um trabalho bem feito e com potencial para obtenção de sucesso. O sistema defensivo, muito bem montado, oferecia muito poucas oportunidades de gol aos adversários, e poucas vezes havia sido vazado nesta sequência de 21 jogos.
A Seleção Brasileira teve uma baixa importante antes do Mundial, perdeu ao lateral-direito Daniel Alves lesionado. A lista final tinha entre os 23 convocados por Tite a:
Goleiros: Alisson (Roma, Itália), Ederson (Manchester City, Inglaterra) e Cássio (Corinthians)
Laterais: Danilo (Manchester City, Inglaterra), Fágner (Corinthians), Marcelo (Real Madrid, Espanha) e Filipe Luís (Atlético de Madrid, Espanha)
Zagueiros: Thiago Silva (Paris St-Germain, França), Miranda (Internazionale, Itália), Marquinhos (Paris St-Germain, França) e Pedro Geromel (Grêmio)
Meias: Casemiro (Real Madrid, Espanha), Fernandinho (Manchester City, Inglaterra), Paulinho (Barcelona, Espanha), Fred Santos (Shakhtar Donetsk, Ucrânia), Renato Augusto (Beijing Guo'An, China), Philippe Coutinho (Barcelona, Espanha) e Willian (Chelsea, Inglaterra)
Atacantes: Neymar (Paris St-Germain, França), Gabriel Jesus (Manchester City, Inglaterra), Douglas Costa (Juventus, Itália), Taison (Shakhtar Donetsk, Ucrânia) e Roberto Firmino (Liverpool, Inglaterra).
As Eliminatórias reservaram uma grande surpresa: a Itália não conseguiu obter a classificação ao ser derrotada pela Suécia na repescagem. Outra surpresa foi a Holanda também não ter conseguido sua classificação (nem à repescagem foi, eliminada num grupo no qual França e Suécia foram adiante). Na América do Sul, o Chile, bi-campeão da Copa América em 2015 e 2016, também ficou de fora. E na América do Norte, os Estados Unidos não obtiveram a classificação ao terminarem atrás de México, Costa Rica, Panamá e Honduras, e nem à repescagem avançaram.
As 32 seleções foram mais uma vez divididas em 8 grupos. No Grupo A estavam Rússia, Uruguai, Egito e Arábia Saudita. No Grupo B estavam Espanha, Portugal, Marrocos e Irã. O Grupo C era composto por França, Dinamarca, Peru e Austrália. O Grupo D era formado por Argentina, Croácia, Nigéria e Islândia. Os argentinos passaram sufoco ao serem derrotados por 3 x 0 pelos croatas depois de terem empatado com os islandeses na estreia, mas ao final obtiveram a classificação ao mata-mata após vencer à Nigéria com um gol a cinco minutos do fim do jogo. No Grupo E estavam Brasil, Sérvia, Suíça e Costa Rica. O Grupo F tinha Alemanha, Suécia, México e Coréia do Sul, e o grupo proporcionou a grande surpresa da Copa: os alemães perderam para os mexicanos por 1 x 0 na primeira partida, recuperaram-se vencendo aos suecos, que nas Eliminatórias haviam derrubado italianos e holandeses, mas ao não conseguiram vencer aos coreanos na última rodada, acabaram prematuramente eliminados. Desde a Copa de 1954, quando obtiveram seu primeiro título mundial, os alemães nunca haviam deixado de chegar às quartas de final de uma Copa do Mundo. Caía um gigante do futebol! O Grupo G tinha a Inglaterra, Bélgica, Tunísia e Panamá. E no Grupo H estavam Colômbia, Polônia, Senegal e Japão. A maldição do campeão: pela terceira Copa consecutiva, o campeão anterior, defensor do título, foi eliminado logo na 1ª fase; assim ocorreu com a Itália, campeã de 2006, em 2010, com a Espanha, campeã de 2010, em 2014, e com a Alemanha, campeã de 2014, em 2018. Isto já havia acontecido com a França, campeã de 1998 e eliminada na 1ª fase em 2002. A partir de 1994, só o Brasil não caiu na 1ª fase na Copa do Mundo seguinte após ter se sagrado campeão. Sempre que um europeu venceu, sofreu com esta maldição.
Estes foram os 32 participantes de uma Copa do Mundo histórica, pois se na Copa de 2014 pela primeira vez havia sido usada a tecnologia para auxiliar aos árbitros em lances duvidosos quanto à bola ter cruzado ou não à linha do gol, desta vez, em 2018, foi dado um outro passo tecnológico adiante, e mais radical, com a adoção do VAR (sigla em inglês para "árbitros assistentes de vídeo"), dando à arbitragem a opção de revisar num monitor de TV, quando comunicada pela equipe de vídeo, lances de pênaltis ou impedimentos. E com o novo recurso, várias penalidades na Copa vieram a ser assinaladas após revisão. Com isso, a Copa do Mundo de 2018 teve a menor quantidade de jogos terminando sem gols em 50 anos. As Copas de 1930, 1934, 1938, 1950 e 1954 não tiveram nenhum zero a zero. O primeiro jogo terminado 0 x 0 numa Copa aconteceu em 11 de junho de 1958 entre Brasil e Inglaterra, tendo o segundo acontecido quatro dias depois entre Suécia e País de Gales (os dois únicos 0-0 daquele Mundial). Dali em diante, em todas as Copas do Mundo nunca mais, até 2018, haveria menos do que três partidas terminadas em 0-0. Nas edições de 2006, 2010 e 2014 houve 7 jogos em 0 a 0 em cada uma. Em toda a Copa 2018, houve apenas um zero a zero, na partida entre França e Dinamarca.
Na sua estreia, a Seleção Brasileira empatou por 1 x 1 com a Suíça. Desde 1978 o Brasil não terminava seu jogo inaugural sem uma vitória. Haviam se passado 40 anos, e 9 edições da Copa do Mundo, desde a última vez na qual a seleção canarinho havia terminado a primeira rodada sem vencer. O time teve maior volume de jogo diante dos suíços, conseguiu sair na frente cedo, com um chute preciso de fora da área de Philippe Coutinho. Porém, no início da etapa final, a defesa falhou numa cobrança de escanteio do adversário, tomando o gol de empate. E não conseguiu mudar o placar até o fim do jogo.
Pressão maior para o segundo jogo, diante da Costa Rica, uma das surpresas do Mundial anterior. Domínio total do time brasileiro. Mas o gol não saía. E se a Seleção Brasileira não teve nenhuma penalidade, contra ou a favor, assinalada pelo árbitro de vídeo, foi a primeira a ter um pênalti desmarcado após a consulta à imagem. Neymar simulou, o juiz apontou a penalidade, mas, avisado, revisou no monitor, e desmarcou o pênalti. O Brasil só saiu do sufoco aos 45 minutos do 2º tempo, quando Coutinho - novamente ele - conseguiu balançar a rede. Furada a retranca do adversário, ainda houve tempo para Neymar marcar outra vez nos acréscimos.
Desde as Copas do Mundo de 1974 e 1978 - em ambas após empatar os dois primeiros jogos - a Seleção Brasileira não entrava na terceira rodada não estando matematicamente classificada. Precisava vencer para avançar. E o adversário não era fácil: a Sérvia tinha um bom nível técnico. Mais uma vez tendo amplo domínio, o time canarinho abriu o placar com Paulinho, aproveitando passe magistral de Coutinho, no fim do 1º tempo. Na etapa final, Thiago Silva, de cabeça, ampliou, selando o resultado final e garantindo a classificação brasileira às oitavas de final.
Oitavas de final que marcaram a queda da Argentina, que num jogo espetacular acabou derrubada por 4 x 3 pela França. O adversário brasileiro era o México, que a partir da vitória obtida na final da Copa das Confederações de 1999, havia dado trabalho algumas vezes à Seleção Brasileira, inclusive lhe tomando a medalha de ouro na final das Olimpíadas de 2012. Foi um jogo duro e catimbado. A seleção não correu riscos e jogou o suficiente para garantir sua vitória. E pela terceira vez consecutiva venceu por 2 x 0. Desta vez, os gols saíram dos pés de Neymar e Firmino, ambos já no 2º tempo. Um prejuízo grande para o time brasileiro naquele jogo foi a perda de Casemiro para a partida seguinte, após o volante receber o segundo cartão amarelo na competição.
Nas quartas de final, a Seleção Brasileira tinha pela frente ao fortíssimo time da Bélgica, do excelente goleiro Courtois, e de um poderoso trio ofensivo formado por Kevin De Bruyne, Eden Hazard e Romelu Lukaku. Logo aos 7 minutos, Thiago Silva, sozinho na pequena área, teve a chance de colocar o Brasil a frente. A bola acertou a trave de Courtois. Pouco depois, um escanteio do outro lado, a bola foi resvalada de cabeça, tocou em Fernandinho - justamente o substituto do suspenso Casemiro - e foi parar dentro da rede protegida por Alisson. Bélgica 1 a 0. Pouco menos de 20 minutos depois, um escanteio para o Brasil foi rebatido pela defesa belga e encontrou Lukaku, que girou e partiu em velocidade; na tentativa de cortar, o sistema defensivo brasileiro deixou De Bruyne sozinho, para penetrar pela direita depois de receber o passe e bater cruzado, longo do alcance do goleiro brasileiro. Bélgica 2 a 0.
No segundo tempo, o time de Tite melhorou, e gradativamente foi tomando conta do jogo. Conseguiu diminuir aos 30 minutos quando Renato Augusto, que recém entrara no jogo, escorou de cabeça, sem dar qualquer chance ao goleiro belga. Dali em diante a Seleção Brasileira partiu para cima da Bélgica com todas as suas forças, e veio a ter três chances claríssimas para conseguir o empate. Na melhor delas, logo após ter diminuído o placar, Renato Augusto entrou frente a frente ao goleiro, mas chutou para fora, rente à trave. Foi sua chance de se consagrar e ser alçado ao posto de herói canarinho. Philippe Coutinho também perdeu excelente oportunidade. A chance derradeira aconteceu num chute perfeito de Neymar de fora da área, aos 45 minutos do 2º tempo, para uma esplendorosa defesa de Courtois, que de tapa colocou para escanteio. No fim: Bélgica 2 x 1 Brasil. As esperanças brasileiras de voltar a ser campeão mundial ruíam perante o time chamado em seu país de "Geração de Ouro".
A Bélgica avançou diante do Brasil, mas caiu diante da França na semi-final. Os franceses avançaram para fazer a final contra a Croácia, que venceu à Inglaterra por 2 x 1 na outra semi-final. Depois da Copa de 2010 ter sido marcada como a primeira vez com uma final na qual não estavam ou Brasil ou Alemanha ou Argentina ou Itália, a Copa do Mundo de 2018 ficou marcada pelo fato de ter sido a primeira vez na história na qual a semi-final não teve a presença ou de Brasil ou de Alemanha ou de Argentina. Novos ventos, de renovação, sopravam no futebol mundial. Eram os frutos da globalização e da concentração de mercado nas maiores ligas de futebol da Europa. Uma semi-final toda ela europeia. Era a quinta vez na história que os quatro semi-finalistas eram todos europeus, repetindo o ocorrido nos Mundiais de 1934, 1966, 1982 e 2006. E pela quarta Copa do Mundo consecutiva, o campeão mundial era europeu. Na final, os franceses venceram por 4 x 2 aos croatas. E duas marcas brasileiras mais eram alcançadas: no pós-Segunda Guerra Mundial, só as Seleções Brasileiras de 1958 e de 1970 haviam conseguido marcar quatro gols numa final antes, e Pelé havia sido o único com menos de 20 anos na história a ter conseguido marcar mais de dois gols na fase de mata-mata, além de ter sido o único sub-20 a marcar em final. Kylian Mbappé, nascido na França e filho de um camaronês e de uma argelina, igualou estas duas marcas de Pelé, tendo feito dois gols na vitória de 4-3 sobre os argentinos, e tendo marcado um dos quatro gols franceses na final.
Os efeitos da globalização e da concentração dos principais jogadores de futebol do planeta em algumas poucas ligas mais ricas da Europa ficaram bem perceptíveis num torneio no qual as equipes jogaram um futebol extremamente padronizado, sem haver nenhuma seleção destoando e demonstrando uma supremacia absoluta, ou uma exuberância técnica e tática inquestionavelmente superior às demais. O mundo inteiro, todas as seleções da Copa do Mundo, jogaram no padrão tático usado nas maiores ligas europeias. Os três times que mais se destacaram pela eficiência e equilíbrio entre os sistemas ofensivo e defensivo - e pela qualidade técnica de alguns de seus valores individuais - foram França, Bélgica e Brasil, que caíram do mesmo lado no ramo que viria a definir um dos finalistas. A França venceu. Mas, em confrontos altamente nivelados e equilibrados entre estas três seleções, qualquer uma delas poderia ter vencido, a vantagem de um gol que se deu para um lado, poderia ter claramente sido para o outro lado, e a história teria sido outra. Mas o futebol só deixa registrado um vencedor, e o time que se sagrou campeão do mundo era formado por: Lloris, Pavard, Umtiti, Varane e Lucas Hernández; Kanté, Matuidi e Pogba; Griezmann, Giroud e Mbappé. E comandado pelo técnico Didier Deschamps, que se tornou o terceiro na história a ter se sagrado campeão como jogador e treinador, igualando ao brasileiro Mário Zagallo, campeão com o Brasil como jogador em 1958 e 1962 e como treinador em 1970, e ao alemão Franz Beckenbauer, campeão com a Alemanha como jogador em 1974 e como treinador em 1990. Deschamps esteve nos dois títulos mundiais obtidos até então pela França, como jogador em 1998 e como treinador em 2018.
Os escolhidos pela FIFA como time ideal do Mundial 2018: Thibaut Courtois (Bélgica), Diego Godin (Uruguai), Thiago Silva (Brasil), Raphael Varane (França) e Marcelo (Brasil); Luka Modric (Croácia), Kevin De Bruyne (Bélgica) e Philippe Coutinho (Brasil); Cristiano Ronaldo (Portugal), Herry Kane (Inglaterra) e Kylian Mbappé (França). Uma seleção escolhida por votação global pela internet, uma forma de escolha que faz com que alguns dos jogadores eleitos tenham entrado mais pelo nome e pelo que construíram na carreira do que propriamente pelo que jogaram naquela Copa de 2018.
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