sábado, 1 de março de 2014

As Revoluções Húngara e Brasileira: nasce um novo futebol

O futebol, como deve ser com tudo, foi evoluindo e amadurecendo organizacional e taticamente. No início, a distribuição em campo era um tanto desorganizada e sem muita mobilidade. O esporte que nasceu na Inglaterra, começou a ganhar um padrão de organização tática nos anos de 1930, especialmente pelos técnicos da Hungria, que criaram o sistema de jogo WM, em alusão à posição dos homens pelo campo. A letra W formava o sistema defensivo: as duas bases da letra eram os beques, protetores do goleiro e da área, e à sua frente, um sistema de contenção com os três vértices superiores do W; dois laterais protegendo as investidas dos pontas adversários e um cabeça de área, que tentava diminuir a exposição dos zagueiros. O M era o sistema de ataque: dois pontas bem abertos e um ponta de lança, os três municiando os dois jogadores de área, que jogavam enfiados na defesa adversária.

Muito se fala na Revolução do Futebol Húngaro, que maravilhou o mundo no começo dos anos 1950. O Time de Ouro, de fato, trouxe um padrão novo e revolucionário, que não mudava tanto a distribuição dos jogadores pelo campo, mas que revolucionava a forma como estes se movimentavam e ocupavam os espaços.

No tabuleiro de jogo da Hungria de 54, havia seis peças-chave estratégicas para o jogo proposto pelo treinador Gusztav Sebes: Ferenc Puskás, Sándor Kocsis, Nándor Hidegkuti, Zoltán Czibor, József Bozsik e Gyula Grosics. Com esta estrutura, foram três as inovações básicas trazidas pelo Time de Ouro e que mudaram o futebol a partir de então: primeiro, o time era preparado para ter um condicionamento aeróbico acima das demais equipes de futebol daquele tempo, permitindo que seus jogadores aguentassem correr distâncias maiores; segundo, ele fez seus centroavantes recuarem para participar da armação das jogadas na intermediária, antes da bola se aproximar da área, desorientando a organização defensiva dos adversários; e em terceiro, ele introduziu a versatilidade nos jogadores, que muitas vezes mudavam de posição no meio do jogo, numa antecipação ao que viria a ser o "Futebol Total" jogado por Holanda e Alemanha nos anos 1970. Na hora de atacar, aquela Hungria costumava chegar com muito mais jogadores ao ataque do que os outros times de futebol estavam acostumados a ver, e na hora de defender, também defendiam com mais jogadores, o time se movimentava quase conjuntamente, como uma onda indo ao ataque e voltando a defesa, e repetindo este movimento o jogo inteiro.

Em seguida à Revolução Húngara, foi o time canarinho quem apresentou sua Revolução Brasileira ao mundo em 1958, num novo padrão de jogo que foi um marco a partir de então, passando o mundo inteiro a adotar o 4-2-4. Os dois laterais recuaram para fechar a defesa junto a dois zagueiros centrais. O ponta de lança recuou para o meio do campo, equilibrando junto a um único cabeça de área a função de ligação entre defesa e ataque. Na frente, quatro homens: dois pontas bem abertos, um pela direita e outro pela esquerda, e dois centroavantes, um dos quais, vez por outra, saindo mais da área para ajudar o ponta de lança. A principal inovação estava nos laterais, que não mais eram peças fixas de defesa, presos à marcação dos pontas adversários, mas agora chegavam ao ataque constantemente, alternando-se, pois se um avançava pela esquerda, o direito ficava na defesa para resguardar um contra-ataque, e se o direito subia ao ataque, o esquerdo ficava. Djalma Santos e Nilton Santos foram mestres nesta revolução, que nunca conseguiu ser copiada por nenhuma seleção do planeta, que não conseguiam encontrar jogadores capazes de fazer as duas funções (de ataque e defesa) com a mesma eficiência. O Brasil teve Djalma Santos-Nilton Santos, depois Carlos Alberto-Everaldo, depois Leandro-Júnior, depois Jorginho-Branco, e depois Cafu-Roberto Carlos. Nenhuma outra seleção nunca teve armas tão versáteis e eficientes como estas.

Na virada dos anos 1960 para os 1970, a distribuição mudou novamente, passando a um 4-3-3, no qual efetivamente o meio de campo tinha um cabeça de área na contenção e dois meias-armadores para munir ao ataque. Mais duas décadas e o 4-3-3 mudava para o 4-4-2, na virada dos 1980 para os 1990. Acabavam-se os pontas e reforçava-se a marcação. O meio de campo ganhava ainda mais importância num time de futebol. Mas daí já vinham outras variâncias e o sistema tático passou a ficar tão ou mais destacado do que o talento dos jogadores que o executavam dentro das quatro linhas. Um time podia se organizar em 3-4-3, com três zagueiros centrais e os laterais avançando para a função de alas, com menos responsabilidade de marcação. Ou então em um esquema 3-5-2, menos voltado para o ataque. Daí teve treinador criando 3-6-1, 4-3-1-2, e toda uma saraivada de numerologias para explicar como suas peças seriam distribuídas pelo tabuleiro gramado dos estádios de futebol.

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