O Brasil foi tri-campeão mundial
de futebol em meio a uma conjuntura nacional de intensas mudanças internas,
marcos para a sociedade brasileira nas décadas seguintes.
Era uma sociedade traumatizada
pelas marcas deixadas por uma Ditadura Militar que torturava e matava àqueles
que ideologicamente não se alinhavam a ela. Depois do Golpe de 1964,
sucederam-se cinco generais na Presidência da República.
Entre 1964 e 1985 o país foi
governado pela Aliança Renovadora Nacional (ARENA), partido criado pelos
militares. Havia permissão para apenas um partido de oposição, o Movimento
Democrático Nacional (MDB). As eleições eram indiretas e sob total controle dos
militares, um ato meramente simbólico. De 1964 a 1966 o presidente foi o
general Humberto Castelo Branco, de 1967 a 1969 foi o general Artur da Costa e
Silva, de 1970 a 1973 foi o general Emilio Garrastazu Médici, de 1974 a 1978
foi o general Ernesto Geisel, e de 1979 a 1985 foi o general João Baptista
Figueiredo.
A oposição, no entanto, vinha
ganhando cada vez mais espaço nas eleições presidenciais, mesmo estas sendo
indiretas, com o Congresso Nacional elegendo o Presidente da República. Na
eleição de 1974, o candidato de oposição, Ulysses Guimarães, conseguiu chegar a
16,0% dos votos. Na seguinte, em 1978, o candidato do MDB, Elias Monteiro,
obteve 38,9% dos votos. A pressão pelo fim do regime crescia.
A Ditadura Militar no Brasil teve
diferentes presidentes e mandatos relativamente regulares, nisto
diferenciando-se um pouco também do que ocorreu em sues países vizinhos. Na
Argentina, a Ditadura foi de 1966 a 1983, tendo no primeiro período, nos
primeiros onze anos, tido sete distintos presidentes e uma tentativa de
redemocratização em 1973, que se seguiu pelo mandato mais longo e período mais
duro de repressão, com o general Jorge Videla na presidência entre 1976 e 1981.
Nos últimos três anos de Ditadura, a Argentina teve cinco distintos
presidentes.
No Chile, único país da América
do Sul a viver o regime socialista, com o presidente Salvador Allende entre
1970 e 1973, a Ditadura Militar, que durou de 1973 a 1990, teve um único
presidente, o general Augusto Pinochet. No Paraguai, a Ditadura do general Alfredo
Stroessner durou de 1954 a 1989. Já no Uruguai houve uma Ditadura
Civil-Militar, que durou de 1973 a 1985, com nenhum presidente neste período tendo
sido militar, embora estes também controlassem a política.
Foi uma era de transformações
para o Brasil, não só na política como na economia. A grandeza arquitetônica já
fora edificada, a auto-estima nacional já havia sido devidamente massageada e a
taça do mundo já era nossa. Todos os brasileiros viviam a imagem de que “com o
malandro brasileiro não há quem possa”. Faltava construir as bases de uma
economia forte. Em trancos e barrancos o país conseguira aproveitar o
pós-Segunda Guerra Mundial para industrializar-se. Era preciso, agora, edificar
a institucionalidade que civilizaria a economia brasileira. O amplo projeto de
reflexões sobre reformas necessárias ao país passou pelas mãos técnicas de alguns economistas que trataram de
moldar aqueles anseios de avanço, o sensível progresso do Brasil nesta área
durante os anos 60 foi composto por um conjunto de leis arquitetadas por
Octávio Bulhões e Roberto Campos. Fez parte deste conjunto de medidas a Lei
4.595, de 1964, conhecida como Lei do Sistema Financeiro.
Logo em seguida veio a Lei 4.728,
de 1965, que foi batizada como Lei do Mercado de Capitais. Ali, naquele
momento, se organizaram instituições como o Banco Central, o Conselho
Monetário, o Sistema Financeiro Nacional, além do Sistema de Poupança e
Empréstimo (“cadernetas”), o qual deflagrou a enorme onda de construções
residenciais através do Sistema Financeiro da Habitação. O FGTS, outra grande
inovação dos anos 60 – poupança de trabalhadores, depositada mensalmente pelos
patrões – não só substituiu a rígida e atrapalhada estabilidade no emprego após
dez anos de serviço, como criou a grande âncora social em caso de desemprego do
cidadão. Todas as mudanças que amadureciam desde a Proclamação da República, em
1889, se somavam para dar ao país condições para o maior salto de progresso da história
do Brasil, resumidos em uma década inteira de crescimento vertiginoso, com a
economia brasileira avançando, em média, a 9,5% ao ano (é o
dado oficial para o período entre 1967 e 1976), no que ficou sendo chamado de
Milagre Econômico Brasileiro. Foi a maior expansão de uma economia nacional em
todo o planeta durante o século XX. Os militares, então, foram às TVs com uma
propaganda política sob o lema “Este é um país que vai para frente”.
No esporte, foram tempos de
surgimento de novas paixões nacionais. Na Fórmula 1, o brasileiro Emerson
Fittipaldi foi campeão mundial em 1972, pilotando uma Lotus, e em 1974,
pilotando uma McLaren. Rapidamente o automobilismo virou uma paixão nacional
também.
Mas o futebol foi o escolhido
pela propaganda militar para exaltar os resultados do país. Enquanto matavam-se
milhares, e torturavam outros mais ainda, a conquista da Copa do Mundo de 1970
foi usada pela Ditadura como símbolo do Brasil que ia para frente. Foi natural
que isto desagradasse a muita gente. Surgiu então a crítica de que o futebol
era o ópio do povo, o entretenimento que distraia e desviava a atenção, sedava
a população e a impedia de refletir sobre qual sociedade se queria construir.
Pelé tinha ficado bastante desgostoso com aas pesadas
críticas recebidas da imprensa após o fracasso no Mundial de 1966, tanto que
havia ameaçado abandonar a Seleção Brasileira e não jogar em 70. Mudou de
idéia, segundo ele mesmo, porque queria provar do que era capaz. Após a Copa do
Mundo, mostrou insatisfação com a forma como a propaganda militar usou a
conquista para uma exaltação de governo. Foi um motivo para ele sinalizar
descontentamento e justificar a decisão que havia tomado: Pelé decidiu
abandonar a seleção nacional, aos 30 anos, alegando que era preciso saber
escolher a hora certa de parar, e o auge da carreira era a hora para isto. Pelo
Santos ainda jogou até 1974. Com a camisa santista, jogou 1.120 jogos e fez
1.033 gols entre 1956 e 1974, uma espetacular média de 0,92 gols por jogo. Com
a camisa brasileira, em partidas oficiais, foram 92 jogos e 77 gols, uma média
de 0,84 gols por jogo. Um ano depois de encerrar a carreira, ele voltou à
ativa, num projeto de tentativa de implementação do futebol profissional nos
Estados Unidos, defendeu o New York Cosmos entre 1975 e 1977, e jogou 107
vezes, fazendo outros 64 gols. O único atleta três vezes campeão da Copa do
Mundo como jogador, e único em toda a história a ter feito mais de mil gols na
carreira. Pelé deixava a Seleção Brasileira.
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