O Brasil é um gigante com
dimensões territoriais continentais. O país representa aproximadamente 50% do
território da América do Sul, assim como sua população também é de cerca de
metade da do subcontinente. No início, as vantagens adquiridas com a não
fragmentação territorial do processo de Independência, não passavam de um
acúmulo de dificuldades e desafios, afinal era necessário superar as grandes
barreiras geográficas e integrar o país colossal, herdado dos tempos coloniais.
No fim do século XIX e início do
século XX, a cabeça do brasileiro estava imersa em um mar de baixa auto-estima,
cheia de complexos de inferioridade. O Brasil havia sido o último país do mundo
a abolir o sistema escravagista, fora o último latino-americano a libertar-se
do poder político de além-mar. Tivera uma independência forjada, sem luta, sem
conquista, e todos os seus vínculos na Europa haviam sido construídos a partir
de regiões pobres do velho continente, longe da prosperidade avassaladora que
emergira com o desenvolvimento industrial. O passado brasileiro parecia não
mais do que uma condenação. Nesse contexto sócio-cultural, após a Proclamação
da República, uma fração da elite brasileira trata de trabalhar para fazer do
Rio de Janeiro uma utopia que mantivesse a unidade territorial nacional e fosse
uma ferramenta útil na construção de um país novo, com ordem, e na busca do
progresso.
Após a Proclamação da República,
a elite brasileira precisou se voltar para a construção de um futuro que
libertasse o país deste seu passado. Era necessário desenvolver a auto-estima
nacional. Neste novo projeto, por força das circunstâncias, foi preciso que a
cidade do Rio se tornasse a peça para um desligamento simbólico do passado que
condenava o Brasil. Foi uma ironia forçada pelo destino, pois a princípio não
era isso o que se desejava. A primeira Carta Constituinte já previa a
construção de uma nova capital federal no planalto Central. O Brasil olhava para
o Rio de Janeiro com uma enorme desconfiança; afinal, ali estavam todos os
alicerces da monarquia de onde partira todo o esquema de repressão portuguesa
às revoltas nas várias províncias que buscaram independência. Afastar-se da capital
do império seria o desligamento simbólico pensado inicialmente, mas o custo de
se transferir a capital federal para o centro do país era muito elevado. Não
havia no país recursos econômicos que viabilizassem esta mudança. Além do mais,
o Rio, como cidade-estado desde 1834 (Município Neutro), oferecia todas as
vantagens estratégicas para abrigar o Distrito Federal sem que houvesse uma
disputa entre as províncias, o que poderia implicar a perda da coesão do
território nacional. Assim, manteve-se a capital onde estava e em torno da
cidade tratou-se de construir a unidade cultural nacional.
A ordem política nos primeiros
anos da república era sustentada, sobretudo, pelos recursos da aristocracia do
café. O Brasil era o grande produtor mundial de café, seguido pela Colômbia.
Até 1850, a principal região produtora era o Vale do Paraíba, no oeste do
estado do Rio de Janeiro, em torno da região de Vassouras e Valença. Com o
esgotamento dos solos fluminenses, a cafeicultura se mudou para o interior de
São Paulo, para as regiões de Limeira, Campinas e Bragança Paulista, e
posteriormente Ribeirão Preto. No nascimento da república, eram nestas regiões
que estavam os principais recursos econômicos.
A política se dividia entre o
Partido Republicano Federal (PRF), o Partido Republicado Paulista (PRP) e o
Partido Republicano Mineiro (PRM). As eleições eram indiretas. A primeira foi
realizada em 1891 e foi vencida por Deodoro da Fonseca, aquele que havia
proclamado a República dois anos antes, que venceu Prudente de Morais, que por
sua vez venceria a eleição seguinte, em 1894.
Daí para frente começou a
República do Café com Leite, com o PRP e o PRM revezando-se no poder. Na
eleição de 1898 venceu Manuel Campos Sales (PRP), na de 1902 venceu Rodrigues
Alves (também PRP), em 1906 venceu Afonso Pena (PRM), em 1910 venceu Hermes da
Fonseca (também PRM), depois em 1914 foi a vez de Venceslau Brás (coligação PRP
– PRM), em 1919 venceu Epitácio Pessoa (PRM), a seguir, em 1922, foi a vez de
Artur Bernardes (também PRM), seguido por Washington Luís (PRP) em 1926.
Apesar do acordo político entre
as aristocracias do café (de São Paulo) e do leite (de Minas Gerais), o clima
político do país estava longe de estar apaziguado. As divergências regionais
continuavam reaparecendo de tempos em tempos. Em 1923 houve a Revolução do Rio
Grande do Sul, em 1924 houve a Revolução Paulista, que voltou a ocorrer em
1932. Em 1935, a Intentona Comunista tentou dar um golpe bolchevique através da
Coluna Prestes, liderada pelo líder comunista Luís Carlos Prestes.
Para agravar, o mundo metia-se na
maior recessão de sua história após o Crash da Bolsa de Nova Iorque em 1929. A
retração mundial impôs pesadas perdas aos cafeicultores. Na iminência de uma
vitória do Partido Republicano Mineiro nas eleições de 1930, os cafeicultores
paulistas se organizaram e induziram Washington Luís a romper o acordo
café-com-leite e eleger Júlio Prestes, do PRP, como presidente. O objetivo do
PRP era obter resguardo político para que a política protecionista ao café
fosse mantida, mitigando os efeitos da crise internacional.
A ação funcionou e Júlio Prestes
venceu a eleição, mas não assumiu. O PRM articulou um golpe de estado junto ao
candidato derrotado, Getúlio Vargas, do Partido Libertador Gaúcho. Eles também
tinham o apoio do Partido Democrático Paulista e do Partido Republicano
Paraibano. Deu-se o golpe de estado que levou a quinze anos de Getúlio Vargas
no poder. O argumento para o golpe era esfriar o “rolo compressor paulista”,
que só pensava em seus interesses e era incapaz de ceder a outras unidades
federativas.
O Brasil era um país formando uma democracia
ainda muito pueril, era essencialmente agrícola e recém começava a conseguir
dar acesso básico à educação para a massa de iletrados que foram tirados à
sorte no fim da escravidão para sobreviverem como pudessem (em 1890, 84% da
população brasileira é analfabeta, em 1920 cai para 75% da população sendo de
analfabetos). Na economia, não havia capital capaz de financiar a implantação
de gigantes industriais, as poucas indústrias que se expandiam nestes tempos
pelo Brasil eram as de bens de consumo, produzidos em plantas modestas e com
capacidade de produção limitada. A unidade do Brasil ainda era puramente aparente,
estava ainda em construção, todas as províncias ainda ansiavam pela separação e
almejavam uma federação similar à dos Estados Unidos. Daí nascia a necessidade
de construir alicerces de maior brasilidade, que permitissem que se forjasse uma
verdadeira unidade nacional.
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