Por ser o Bi-Campeão Olímpico, a FIFA escolheu ao Uruguai como sede da 1ª Copa do Mundo de Futebol, jogada em 1930. Os uruguaios, ainda por cima, comemoravam o Centenário de sua Independência. Foram convidados todos os países filiados à Federação Internacional, e 13 deles aceitaram o convite, tendo sido divididos em 4 grupos. Um fato curioso, é que nas 12 edições do Campeonato Sul-Americano jogadas até aquele momento, só duas vezes a competição havia tido 5 participantes, tendo nas demais tido 3 ou 4. Eis que na primeira Copa do Mundo, a FIFA conseguiu o que a Confederação Sul-Americana não havia conseguido até então, reuniu 7 países da América do Sul num mesmo torneio de futebol. Ainda havia 2 países da América do Norte, e só 4 europeus se deslocaram a Montevidéu. Pesos-pesados do futebol do Velho Continente - como Inglaterra, Itália e Alemanha - não atenderam ao convite da FIFA.
A Seleção Brasileira claramente não chegava preparada para aquela disputa. Em primeiro lugar, porque após sequer ter entrado em campo em 1926 e 1927, entre 1928 e 1929 só havia feito quatro jogos, todos amistosos, e todos contra clubes. Enquanto o Brasil havia abdicado de disputar o Campeonato Sul-Americano por desavenças com uruguaios e, sobretudo, argentinos, estes dois dominaram o cenário competitivo do continente. No Sul-Americano, o Uruguai tinha 6 títulos e a Argentina tinha 4; os dois tinham feito a final das Olimpíadas de 1928 e acabaram vindo a fazer a final da Copa de 30 também. Argentinos e uruguaios mantinham uma base que há anos jogava junto. O futebol do Brasil estava muito atrás, sem uma equipe entrosada e que se conhecesse bem naquele momento.
Além dos conflitos políticos externos com seus vizinhos, o futebol brasileiro vivia de conflitos internos. Desde 1920, as desavenças entre a Confederação Brasileira e a Federação Paulista fizeram com que só tenha havido a utilização de jogadores paulistas nos Sul-Americanos de 1922 e 1925, e nos amistosos de 1929. E por razões extra-campo, decorrentes do Golpe de Estado dado por Getúlio Vargas para assumir à Presidência da República, destituindo o Partido Republicano Paulista, a seleção convocada para representar ao país naquela 1ª Copa não tinha jogadores paulistas (houve só uma exceção, tendo o atacante Araken, do Santos, sido chamado).
Em segundo lugar, a Seleção Brasileira mal conhecia o futebol europeu. O Brasil nunca havia enfrentado uma seleção europeia antes do jogo válido pela estreia da Copa de 1930. Antes, só havia enfrentado a clubes europeus, e ainda assim em pouquíssimas oportunidades: contra o Exeter City, da Inglaterra, em 1914, o Motherwell, da Escócia, em 1928, e o Ferencvaros, da Hungria, em 1929, todos três confrontos no campo das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. O confronto no primeiro jogo do Mundial de 1930 foi a primeira partida de futebol da Seleção Brasileira contra uma seleção da Europa em sua história, um Brasil e Iugoslávia em Montevidéu, em 14 de julho de 1930.
O grupo A foi configurado com Argentina, Chile, França e México. O grupo B com Brasil, Bolívia e Iugoslávia. O grupo C com Uruguai, Peru e Romênia. E o grupo D com Bélgica, Paraguai e Estados Unidos. Apenas os primeiros colocados avançavam para fazer as semi-finais. No grupo brasileiro, pelo histórico de jogos nos Anos 1920, a Bolívia não deveria oferecer grande resistência nem a brasileiros nem a iugoslavos. Assim, a estreia praticamente já valia a presença na semi-final.
Logo no primeiro tempo, Aleksandar Tirnanic, aos 21 minutos, e Ivan Bek, aos 30 minutos, colocaram a Iugoslávia com uma confortável vantagem de 2 a 0 no placar. No segundo tempo, Preguinho, aos 17 minutos, fez o primeiro gol da Seleção Brasileira na história das Copas do Mundo, diminuindo. Mas ficou nisto. Placar final: 2 x 1.
No segundo jogo, o Brasil ganhou da Bolívia por 4 x 0, assim como a Iugoslávia não teve dificuldade para passar pelos bolivianos, avançando, mas depois sendo massacrada pelo Uruguai na semi-final por 6 x 1. Argentina e Estados Unidos também foram à semi. E Argentina e Uruguai, como já era esperado por todos, fizeram a final, repetindo o confronto feito em Amsterdã dois anos antes na final do torneio de futebol das Olimpíadas.
A final foi sensacional, diante de 68 mil uruguaios que lotavam o Estádio Centenário. A celeste saiu na frente aos 12 minutos de jogo, com gol de Pablo Dorado. O bom e bravo time argentino virou, gols de Carlos Peucelle, aos 20, e Guillermo Stábile, aos 37, e foi para o intervalo na frente. No segundo tempo, com gols de Pedro Cea, aos 12, Santos Iriarte, aos 23, e de Héctor Castro, aos 44, o Uruguai venceu por 4 x 2 e tornou-se Campeão Mundial. O maior vencedor de títulos sul-americanos e bi-campeão olímpico, confirmava seu favoritismo e era também o campeão do mundo. Um time com: Ballesteros, Nasazzi e Mascheroni; Leandro Andrade, Lorenzo Fernández e Gestido; Pablo Dorado, Héctor Scarone, Héctor Castro, José Pedro Cea e Iriarte, sob o comando do técnico Alberto Suppici. Os argentinos, vice-campeões, de: Botasso, Della Torre e Paternoster; Juan Evaristo, Luisito Monti e Pedro Suárez; Peucelle, Varallo, Guillermo Stábile, Manuel Ferreyra e Mario Evaristo, com o técnico sendo Francisco Olazar.
A Seleção Brasileira não teve nenhum jogador escolhido entre os melhores da Copa de 30, cujos eleitos foram: Ballesteros (Uruguai), Nasazzi (Uruguai) e Ivkovic (Iugoslávia); Gestido (Uruguai), Leandro Andrade (Uruguai) e Luisito Monti (Argentina); Pedro Cea (Uruguai), Héctor Castro (Uruguai), Héctor Scarone (Uruguai), Stábile (Argentina) e Patenaude (Estados Unidos).
O Uruguai tinha o melhor futebol do mundo naquele momento, e foi um justo campeão. No cenário local, esteve bem a frente dos rivais brasileiros e argentinos desde a largada, pois entre 1916 e 1926, foi campeão de 6 das 10 primeiras edições do Campeonato Sul-Americano. Desenvolveu seu futebol tanto, que se tornou o primeiro fora da Europa a obter Medalha de Ouro nas Olimpíadas, sendo bi-campeão em 1924 e 1928. O título de Campeão Mundial foi o prêmio final por esta evolução.
Uruguai Campeão Mundial de 1930
Quando o Brasil abdicou da disputa do Sul-Americano, o nível do futebol da Argentina não tinha uma diferença significativa frente ao brasileiro. Até 1925, a Argentina só tinha um título continental, e o Brasil já tinha dois. A partir de então os argentinos cresceram enquanto os brasileiros sequer entravam em campo, e conquistaram três títulos continentais e se tornaram vice-campeões olímpicos e vice-campeões mundiais.
Não houvesse se enrolado em conflitos políticos externos e internos, a Seleção Brasileira poderia ter aspirado chagar a 1930 em condições de figurar, no mínimo, entre os quatro melhores da primeira Copa do Mundo. O que aconteceu logo após o Mundial, prova o quanto isto era viável. Algumas das seleções que atuaram em Montevidéu fizeram uma parada no Rio de Janeiro antes de regressarem para casa. E o Brasil aproveitou estas passagens para realizar três amistosos, contra França, Iugoslávia e Estados Unidos. Venceu os três.
Para o primeiro, um duelo com a França, reforçou-se com os jogadores paulistas que não tinham ido à Copa, e com eles venceu por 3 a 2. A Seleção Francesa havia sido a principal surpresa negativa daquele Mundial, pois depois de ter começado com goleada por 4 a 1 no México, perdeu duas vezes por 1 a 0, para Argentina e Chile, e foi eliminada. No Rio, depois da Copa, também acabou derrotada no amistoso contra o Brasil.
No duelo seguinte da Seleção Brasileira, contra seu algoz no Mundial, a Iugoslávia, abdicou dos paulistas, entrando em campo com 7 jogadores que tinham atuado naquele encontro de estreia em Copa de Mundo, contra um time iugoslavo que jogou com os mesmos 11 titulares que atuaram em Montevidéu. Jogando em casa, e já sem o fator "novidade" de nunca antes ter enfrentado uma seleção europeia, não teve dificuldades para vencer por impiedosos 4 a 1, mostrando que com um pouco mais de preparação, tinha plenas condições de ter estado presente numa semi-final. Por fim, enfrentou ao time dos EUA que tinham sido justamente um dos semi-finalistas da Copa, e mesmo não colocando todos os seus principais jogadores, usando na maioria nomes que tinham sido reservas na Copa, ainda assim venceu por 4 a 3 aos norte-americanos. Prova de que: decisões erradas, resultados negativos!
Seleção Brasileira de 1930
JOGOS NO ANO:
14/07/1930 - BRASIL 1 x 2 IUGOSLÁVIA
Copa do Mundo - Estádio Gran Parque Central, Montevidéu, Uruguai
Gols: Tirnanic (21'1T), Ivica Bek (30'1T) e Preguinho (17'2T)
Brasil: Joel (América/RJ), Brilhante (Vasco) e Itália (Vasco); Hermógenes (América/RJ), Fausto dos Santos (Vasco) e Fernando Giudicelli (Fluminense); Poly (Americano/RJ), Nilo (Botafogo), Araken Patusca (Santos), Preguinho (Fluminense) e Teóphylo (São Cristóvão).
Téc: Píndaro de Carvalho
Iugoslávia: Milovan Jaksic (BASK Belgrado), Milutin Ivkovic (BASK Belgrado) e Dragan Mihajlovic (Beogradski); Milorad Arsenijevic (Beogradski), Ljubisa Stefanovic (Sete) e Momcilo Djokic (Iugoslavia Belgrado), Aleksandar Tirnanic (Beogradski), Blagoje Marjanovic (Beogradski), Djorde Vujadinovic (Beogradski), Ivica Bek (Sete) e Branislav Sekulic (Iugoslavia Belgrado).
Téc: Bosko Simonovic
Brasil x Iugoslávia, 1930
20/07/1930 - BRASIL 4 x 0 BOLÍVIA
Copa do Mundo - Estádio Centenário, Montevidéu, Uruguai
Gols: Moderato (37'1T), Preguinho (12'2T), Moderato (28'2T) e Preguinho (38'2T)
Brasil: Veloso (Fluminense), Zé Luiz (São Cristóvão) e Itália (Vasco); Hermógenes (América/RJ), Fausto dos Santos (Vasco) e Fernando Giudicelli (Fluminense); Benedicto (Botafogo), Carvalho Leite (Botafogo), Russinho (Vasco), Preguinho (Fluminense) e Moderato (Flamengo).
Téc: Píndaro de Carvalho
Bolívia: Jesús Bermúdez (Oruro Royal), Segundo Durandal (San José) e Casiano Chavarría (Calavera); Renato Sáenz (The Strongest), Diogenes Lara (Bolivar) e Jorge Valderrama (Oruro Royal); Eduardo Reyes Ortiz (The Strongest), José Bustamante (Litoral), Rafael Méndez (Universitário de La Paz), Mario Alborta (Bolivar) e René Fernández (Alianza de Oruro).
Téc: Ulises Saucedo
01/08/1930 - BRASIL 3 x 2 FRANÇA
Amistoso - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Gols: Edmond Delfour (2), Teóphylo, Friedenreich e Heitor Domingues
Brasil: Veloso (Fluminense), Grané (Corinthians) e Del Debbio (Corinthians); Pepe (Palestra Itália/SP), Fausto dos Santos (Vasco) e Serafini (Palestra Itália/RJ); Ministrinho (Palestra Itália/SP), Heitor Domingues (Palestra Itália/RJ), Arthur Friedenreich (São Paulo), Nilo (Botafogo) e Teóphylo (São Cristóvão).
Téc: Píndaro de Carvalho
França: Alex Thepot (Red Star Olympique), Étienne Mattler (Sochaux) e Marcel Capelle (Racing Paris); Augustin Chantrel (Sports Géneraux), Celestin Delmer (Amiens) e Alex Villaplane (Racing Paris); Ernest Libérati (Amiens), Edmond Delfour (Racing Paris), Marcel Pinel (Red Star Olympique), Lucien Laurent (Sochaux) (André Maschinot (Sochaux)) e Marcel Langiller (Excelsior Roubaix).
Téc: Raoul Caudron
10/08/1930 - BRASIL 4 x 1 IUGOSLÁVIA
Amistoso - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Gols: Carvalho Leite (2), Benedicto, Ivica Bek e Russinho
Brasil: Joel (América/RJ), Zé Luiz (São Cristóvão) e Itália (Vasco); Hermógenes (América/RJ), Fausto dos Santos (Vasco) (Benevenuto (Flamengo)) e Fernando Giudicelli (Fluminense); Benedicto (Botafogo), Nilo (Botafogo), Carvalho Leite (Botafogo), Russinho (Vasco) e Teóphylo (São Cristóvão) (Santana (Vasco)).
Téc: Píndaro de Carvalho
Iugoslávia: Milovan Jaksic (BASK Belgrado), Milutin Ivkovic (BASK Belgrado) e Teofilo Spasojevic (Iugoslavia Belgrado); Milorad Arsenijevic (Beogradski), Dragan Mihajlovic (Beogradski) e Momcilo Djokic (Iugoslavia Belgrado), Aleksandar Tirnanic (Beogradski), Blagoje Marjanovic (Beogradski), Djorde Vujadinovic (Beogradski), Ivica Bek (Sete) e Branislav Sekulic (Iugoslavia Belgrado).
Téc: Bosko Simonovic
17/08/1930 - BRASIL 4 x 3 ESTADOS UNIDOS
Amistoso - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Gols: Preguinho, Carvalho Leite, Patenaude (2), Doca, Teóphylo e Andy Auld
Brasil: Joel (América/RJ), Zé Luiz (São Cristóvão) e Itália (Vasco); Hermógenes (América/RJ), Oscarino (Ypiranga/RJ) e Benevenuto (Flamengo); Newton (Flamengo), Doca (São Cristóvão), Carvalho Leite (Botafogo), Preguinho (Fluminense) e Teóphylo (São Cristóvão).
Téc: Píndaro de Carvalho
EUA: Jimmy Douglas (New York Giants), Alex Wood (Broolklyn Wanderers) e George Moorehouse (New York Giants); Jimmy Gallagher (New York Giants), Billy Gonsalves (Fall River Marksmen) e Philip Slone (New York Giants); Jim Brown (New York Giants), Andy Auld (Providence Clamdiggers), Bert Patenaude (Fall River Marksmen), Mike Bookie (Cleveland Slavia) e Tom Florie (New Bedford Whalers).
Téc: Bob Millar
RESUMO:
Seleção Brasileira de 1930:
Joel (América/RJ), Zé Luiz (São Cristóvão/RJ) e Itália (Vasco); Hermógenes (América/RJ), Fausto dos Santos (Vasco) e Fernando Giudicelli (Fluminense); Benedicto (Botafogo), Nilo (Botafogo), Carvalho Leite (Botafogo), Preguinho (Fluminense) e Teóphylo (São Cristóvão/RJ).
Artilharia: Preguinho (4), Carvalho Leite (3), Moderato (2), Teóphylo (2), Friedenreich (1), Heitor Domingues (1), Benedicto (1), Russinho (1) e Doca (1)
Participação:
5 jogos: --
4 jogos: Itália, Hermógenes, Fausto dos Santos e Teóphylo
3 jogos: Joel, Zé Luiz, Fernando Giudicelli, Nilo, Carvalho Leite e Preguinho
2 jogos: Veloso, Benevenuto, Benedicto e Russinho
1 jogo: Brilhante, Grané, Del Debbio, Pepe, Serafini, Oscarino, Poly, Newton, Doca, Santana, Ministrinho, Araken Patusca, Heitor Domingues, Arthur Friedenreich e Moderato
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