quarta-feira, 21 de maio de 2014

Noventa milhões em ação

Com Zagallo recém sentado no banco de reservas, a seleção voltou a campo, uma semana depois do empate com o Bangu, para enfrentar o Chile no Morumbi, em São Paulo. O time não mudou na escalação, mas mudou em atitude, goleou os chilenos por 5 x 0, com Pelé e Roberto Miranda marcando dois gols cada e Gérson fechando o placar.

E logo na primeira convocação de Zagallo, eis que o nome de Dario, o Dadá Maravilha, o Peito de Aço, centroavante do Atlético Mineiro, personagem central da demissão de João Saldanha, apareceu na lista de convocados.

Seguiu-se uma seqüência de seis amistosos em solo brasileiro antes do embarque para o México, que aconteceu um mês e meio antes da Copa do Mundo começar. O Brasil voltou a vencer o Chile, desta vez por 2 x 1 no Maracanã. Depois jogou em Manaus contra a Seleção Amazonense, vencendo por 4 x 1. A seguir, empate sem gols com o Paraguai no Rio, vitória sobre a Seleção Mineira por 3 x 1 em Belo Horizonte, empate sem gols com a Bulgária em São Paulo e, na despedida, vitória por 1 x 0 sobre a Áustria no Maracanã.

Daí a seleção embarcou para o México, onde deu início a um forte trabalho de condicionamento aeróbico comandado pelos preparadores físicos Cláudio Coutinho e Carlos Alberto Parreira.

Houve mais três amistosos preparatórias, com vitórias por 3 x 0 sobre um Combinado de Guadalajara, por 5 x 2 sobre um Combinado de León e por 3 x 0 sobre o Irapuato, clube mexicano. O time estava pronto, técnica e fisicamente, para jogar a Copa do Mundo. Em dez amistosos sob o comando de Zagallo, foram oito vitórias e dois empates.

A 9ª Copa do Mundo, no México, mantinha o formato das anteriores. As baixas surpreendentes nas Eliminatórias foram a Argentina, que, com derrotas para Bolívia e Peru, foi eliminada, e, na Europa, a França, eliminada pela Suécia. O Grupo 1 trazia União Soviética, Bélgica, México e El Salvador; o Grupo 2 tinha Itália, Uruguai, Suécia e Israel; o Grupo 3 tinha Inglaterra, Brasil, Tchecoslováquia e Romênia; e o Grupo 4 tinha Alemanha, Bulgária, Peru e Marrocos. O grupo brasileiro era tido como o mais difícil daquele Mundial.


A seleção titular de Zagallo trazia inovações em relação ao time montado por Saldanha. O novo treinador foi ousado. Tinha dois brilhantes jogadores na contenção do meio-campo: Clodoaldo e Piazza. Achou espaço para ambos, recuando o segundo para jogar como zagueiro. Tinha Gérson, Rivellino, Tostão e Pelé, todos legítimos camisas 10 de seus clubes, responsáveis pela armação e o municiamento do ataque. Arrumou espaço para todos jogarem juntos, empurrando Rivellino para a ponta-esquerda e tirando Edu do time titular.

A Seleção Brasileira começava então sua caminhada, embalada pela música que marcou aquela Copa do Mundo: Noventa milhões em ação / Pra frente Brasil, do meu coração / Todos juntos vamos / Pra frente Brasil / Salve a Seleção / De repente é aquela corrente pra frente / Parece que todo o Brasil deu a mão / Todos ligados na mesma emoção / Tudo é um só coração! / Todos juntos vamos, pra frente Brasil, Brasil / Salve a Seleção!

A campanha brasileira começou com uma estréia arrasadora e mostrando um futebol de encher os olhos. O Brasil saiu atrás no marcador, mas sobrou em campo, goleou os tchecoslovacos por 4 x 1, tendo os dois últimos gols, marcados por Jairzinho, sido duas obras de arte. Em um, ao ser lançado, deu um balão magistral no goleiro, dominando no peito com extrema categoria e fuzilando as redes, e no outro concluindo após vários dribles que entortaram vários zagueiros.

Já o segundo jogo era uma decisão. O Brasil tinha pela frente os detentores do título mundial, com os lendários Bobby Moore e Bobby Charlton. Foi um jogo duríssimo, com muitas chances de gol de lado a lado, num jogo aberto, do qual qualquer um poderia ter saído vencedor. Venceu o Brasil, com gol de Jairzinho. Foi um dos maiores jogos de futebol de todos os tempos.


Com duas vitórias e a classificação em primeiro lugar garantida, o Brasil venceu a Romênia por 3 x 2. O adversário pela frente nas quartas de final era o Peru, treinado pelo brasileiro Didi, algoz dos argentinos nas Eliminatórias, e liderado pelo craque Teófilo Cubillas. Apesar do placar dilatado, com vitória canarinho por 4 x 2, a partida não foi nada fácil, foi duríssima. O Brasil avançou à semi-final para encarar o Uruguai, seu algoz na Copa de 50.

O Brasil levou um grande susto quando Luis Cubilla fez o gol uruguaio aos 19 minutos do primeiro tempo. A partida seguiu extremamente nervosa, com muita tensão. O gol redentor de Clodoaldo no finzinho do primeiro tempo foi importantíssimo para o time ter tranqüilidade na segunda etapa para virar o jogo, com gols de Jairzinho e Rivellino; o Brasil fez 3 x 1 e voltou a conseguir classificar-se para uma final de Copa do Mundo.

A Seleção Brasileira estava jogando um futebol exuberante. Tecnicamente bonito e taticamente perfeito. Cada jogo, cada vitória, foi uma obra magistral. O Brasil jogava em harmonia perfeita, dava um concerto futebolístico completo.

O adversário na final era a Itália, que na semi-final venceu a Alemanha Ocidental, de Franz Beckenbauer e Gerd Muller, num jogo épico, que certamente está entre os melhores da história das Copas do Mundo. O tempo normal terminou 1 x 1, com o gol alemão saindo aos 44 minutos do segundo tempo. Na prorrogação, a Alemanha virou, mas ainda na primeira parte do tempo extra, os italianos reviraram e puseram 3 x 2 a seu favor. Faltando seis minutos para o fim, os alemães voltaram a conseguir o empate, mas no minuto seguinte Rivera decretou o 4 x 3 definitivo.

A equipe brasileira entrou em campo, em 21 de junho de 1970, com: Félix, Carlos Alberto, Brito, Wilson Piazza e Everaldo, Clodoaldo e Gérson, Jairzinho, Tostão, Pelé e Rivellino. E o que se viu naquele dia foi o capítulo final de uma epopéia épica. O adversário impunha respeito, era o campeão da Eurocopa de 1968.

O título começou a ser escrito com Tostão batendo um lateral que Rivellino emendou de primeira para dentro da área, onde encontrou a testada de Pelé para as redes. A descrição do italiano Facchetti para aquele gol é sensacional: "Pulei primeiro que ele para cabecear a bola. Eu era mais alto e tinha mais impulsão. Quando desci ao chão, olhei pra cima, perplexo. Pelé ainda estava lá, no alto, cabeceando a bola. Parecia que podia ficar no ar o tempo que quisesse".


Os italianos empataram no primeiro tempo. Mas o Brasil era muito superior em campo. Foi aos 20 minutos da etapa final que Gérson limpou um marcador na entrada da área e disparou sua canhota de ouro num tiro transversal que estufou as redes. Brasil 2 x 1.

Cinco minutos depois e Gérson fez um lançamento magistral do meio de campo na cabeça de Pelé, que só ajeitou para Jairzinho ampliar. Mas ainda tinha mais. E novamente em mais um lance esplêndido, que começou com Clodoaldo driblando vários italianos na intermediária do Brasil, ele passou e a bola foi de pé em pé até o ataque, onde parou em Pelé, que levantou a cabeça e deu um passe no vazio para o lado direito da área italiana, Carlos Alberto, em velocidade, emendou de primeira, sem precisar mudar o ritmo de suas passadas. Uma bomba, que o goleiro nem viu passar, estufou a rede a quatro minutos do fim. 4 x 1. A Seleção Brasileira fechava com chave de ouro uma Copa do Mundo perfeita.

Foi na Copa de 70 que Pelé quase fez um gol de antes da linha do meio-campo, surpreendendo o goleiro Viktor, da Tchecoslováquia, adiantado; a bola passou rente à trave. No jogo com o Uruguai, Pelé emendou uma cobrança de tiro de meta de primeira, quase fazendo um gol, e deu um drible de corpo sensacional no goleiro Mazurkiewicz, pegando a bola do outro lado e por pouco não fazendo mais um gol sobre o Uruguai.

Na Copa de 70, o Brasil venceu todos os sete jogos que disputou. Só nos Mundiais de 1930, 1934 e 1938, que eram em sistema mata-mata, o campeão não havia empatado ou perdido pelo menos uma vez. Um feito tão difícil, que só voltou a se repetir em 2002, também com o Brasil sendo campeão. Das sete vitórias, em três a seleção fez 4 gols, e em outras duas fez 3 gols. Um time com uma força de ataque incrível. Mais raro ainda foi o feito de Jairzinho, que jamais foi repetido na história, ele fez gol em todos os sete jogos da seleção naquela Copa do Mundo.

Com o terceiro título mundial, o Brasil conquistava em definitivo a Taça Jules Rimet, que foi erguida pelo capitão Carlos Alberto. O Brasil era tri-campeão mundial!

Carlos Alberto ergue a Taça Jules Rimet 


Ficha Técnica
BRASIL 4 x 1 ITÁLIA
Gols: Pelé (18'1T), Bonisegna (37'1T), Gérson (20'2T), Jairzinho (25'2T) e Carlos Alberto Torres (42'2T)

BRASIL: Félix; Carlos Alberto, Brito, Wilson Piazza e Everaldo; Clodoaldo, Gérson e Pelé; Jairzinho, Tostão e Rivellino.

ITÁLIA: Enrico Albertosi, Tarcisio Burgnich, Pierluigi Cera, Roberto Rosato e Giacinto Facchetti; Giancarlo De Sisti, Mário Bertini (Antonio Juliano) e Sandro Mazzola (Gianni Rivera); Angelo Domenghini, Roberto Bonisegna e Luigi Riva.


A seleção dos melhores do Mundial tinha cinco brasileiros: Mazurkiewicz (Uruguai), Carlos Alberto (Brasil), Beckenbauer (Alemanha), Wilson Piazza (Brasil) e Facchetti (Itália), Gérson (Brasil) e Bobby Charlton (Inglaterra), Jairzinho (Brasil), Teófilo Cubillas (Peru), Pelé (Brasil) e Gerd Muller (Alemanha).

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