sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Seleção Brasileira em 1922


O Brasil celebrava o Centenário de sua Independência em 1922 e foi a sede da 6ª edição do Campeonato Sul-Americano. Os discursos ufanistas e nacionalistas nos jornais ligados ao governo exigiam o título a todo custo. Ademais, foi a primeira vez na história que um mesmo estádio recebeu pela 2ª vez uma edição da principal competição continental, jogada no Estádio das Laranjeiras, no bairro homônimo, campo do Fluminense, no Rio de Janeiro. Foi a primeira vez também que o torneio não foi disputado como um quadrangular, tendo sido um pentagonal entre Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai.

Estádio das Laranjeiras em 1922

Para celebrar a disputa no Brasil, deu-se fim ao litígio entre a Confederação Brasileira e a Federação Paulista que havia impedido o país de ser representado por sua força máxima de futebol nas edições de 1920 e 1921. E a volta dos jogadores paulistas à Seleção Brasileira foi fator determinante para que o Brasil conquistasse o seu segundo título de Campeão Sul-Americano em sua história.

O início da campanha foi negativo. Esperava-se uma vitória contundente em cima do Chile, para quem a Seleção Brasileira nunca havia perdido até então (três vitórias, com um 5 a 0 e um 6 a 0, e um empate). No entanto, apesar de ter saído na frente no placar, os chilenos conseguiram empatar no fim da primeira etapa, sem que o Brasil conseguisse reverter este empate na etapa final. Arthur Friedenreich não estava em plenas condições físicas, lutando contra uma contusão, e a força ofensiva do time sentiu a diferença no seu poder de ataque.

A tabela era confusa. No segundo jogo, o Uruguai iniciou a sua campanha vencendo ao Chile. O Brasil voltou a campo contra o Paraguai antes mesmo que a Argentina fizesse sua estreia. O atacante Heitor Domingues, do Palestra Itália, foi lançado no lugar de Fried no ataque, mas mesmo assim o poderio ofensivo da Seleção Brasileira não melhorou. O time novamente saiu na frente no 1º tempo, desta vez com gol de Amílcar, mas mais uma vez cedeu o empate. A situação da Seleção Brasileira ia ficando desesperadora, e tudo levava a crer num fiasco dentro de sua própria casa. Ainda mais após a Argentina, então campeã, ter feito a sua estreia goleando ao Chile por 4 a 0.

Fried voltou ao ataque contra o Uruguai, mas mais uma vez o time não produziu, não saindo de um empate sem gols. O título parecia perdido: três jogos e três empates. O Brasil tinha três pontos. Argentina e Uruguai, com uma vitória cada nos únicos jogos que tinham feito até então, tinham 2 pontos. Paraguai e Chile só tinham empatado com o Brasil, cada um respectivamente com um ponto na tabela.

Na sequência, o Paraguai passou pelo Chile, o Uruguai fez 1 a 0 na Argentina, e os paraguaios venceram aos uruguaios pelo mesmo placar, numa partida na qual os derrotados ficaram indignados com a atuação do árbitro brasileiro. Com o resultado, o Paraguai tinha 5 pontos e só lhe restava um confronto contra a Argentina. O Uruguai também tinha 5 pontos, mas não jogava mais. O Brasil tinha 3 pontos, e também só lhe restava um confronto contra a Argentina. Os argentinos tinham 2 pontos, mas dois jogos por fazer, podendo chegar a 6 e serem campeões se vencessem estes dois jogos.

Quando a Seleção Brasileira entrou em campo contra a Argentina em 15 de outubro, era vencer ou vencer. E ainda dependeria de uma vitória argentina sobre os paraguaios, no jogo derradeiro, para que houvesse um jogo extra. Era uma situação dramática! O heroi que manteve o Brasil vivo foi o mesmo de 1919: o atacante Neco, do Corinthians, que marcou o gol no finalzinho do 1º tempo. Ainda assim, o segundo tempo foi tenso, pois um gol argentino matava as chances brasileiras. Até que nos minutos finais foi assinalado um pênalti para a seleção, com muita reclamação dos argentinos. A cobrança acabou convertida por outro jogador do Corinthians, o volante Amílcar: Brasil 2 a 0.

Restava que a Argentina vencesse ao Paraguai na última rodada, mais uma vez com arbitragem brasileira, para forçar um desempate. Aos paraguaios bastava um empate para conquistar o título. Desta vez, quem salvou à Seleção Brasileira foi o ponta de lança alvi-celeste Juan Francia, autor dos dois gols que derrotaram aos paraguaios. O segundo gol, de pênalti, gerou mais protestos dos visitantes contra a arbitragem local. Com este resultado, Paraguai, Uruguai e Brasil terminaram com 5 pontos, os dois primeiros com 2 vitórias, 1 empate e 1 derrota, e os brasileiros com 1 vitória e 3 empates. Só que os uruguaios já tinham ido embora - indignados com a atuação da arbitragem após a derrota para o Paraguai, regressaram a seu país - abandonaram o torneio e deixaram a cidade do Rio de Janeieo antes da conclusão da competição.

Assim, como havia acontecido na conquista da edição de 1919, o título foi decidido num jogo extra no mesmo Estádio das Laranjeiras, sendo desta vez, porém, contra o Paraguai (naquela havia sido frente ao Uruguai). A vitória brasileira começou com um gol de Neco no 1º tempo, e acabou consolidada com dois gols do ponta-direita Formiga, aclamado como herói nacional. Pela segunda vez na história, o Brasil era campeão sul-americano de futebol! O povo saiu às ruas da capital para celebrar o triunfo.

Naquele ano de 1922, além do torneio oficial a Seleção Brasileira também teve atividade diplomática. Curiosamente, no mesmo dia no qual disputava o jogo extra da final contra o Paraguai no Estádio das Laranjeiras, uma "Seleção Brasileira alternativa" entrava em campo para enfrentar à Argentina pela Copa Roca em São Paulo. Dias depois, já reforçada por alguns dos jogadores campeões sul-americanos, a seleção voltaria a entrar em campo na capital paulista, desta vez para enfrentar ao Paraguai pela Taça Rodrigues Alves. Venceu aos dois jogos.

Até aquele momento da história, a Seleção Brasileira havia entrado em campo 32 vezes, 20 delas em jogos valendo por Campeonatos Sul-Americanos. Tinham sido 14 jogos no Rio de Janeiro (todos no Estádio das Laranjeiras), 10 jogos em Buenos Aires, 5 em Montevidéu e 3 em Viña del Mar, no Chile. E eis que em 22 de outubro de 1922 o Brasil entrou duas vezes em campo no mesmo dia e em duas cidades diferentes, um jogo no Rio e outro em São Paulo.

Este evento representou a primeira vez na qual a Seleção Brasileira atuou em território nacional fora da então capital federal: entre 1914 e 1918, os 5 primeiros jogos realizados no Rio de Janeiro tinham sido amistosos contra clubes, uma vez contra o Exeter City, da Inglaterra, e duas vezes contra Dublin, do Uruguai, e Barracas, da Argentina; em 1919, houve outros 5 jogos, quatro pelo Campeonato Sul-Americano e um amistoso contra a Argentina; e em 1922 as 4 partidas da outra edição do Sul-Americano jogada no Rio. Assim, os 14 primeiros jogos da Seleção Brasileira no país tinham sido todos realizados no Rio de Janeiro. A partir de 22, a geografia de atuação foi extendida também a São Paulo.




JOGOS NO ANO:


17/09/1922 - BRASIL 1 x 1 CHILE
Campeonato Sul-Americano - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Gols: Tatu (9'1T) e Bravo (41'1T)

Brasil: Marcos Carneiro de Mendonça (Fluminense), Palamone (Botafogo) e Barthô (A.A. São Bento); Laís (Fluminense), Amílcar (Corinthians) e Fortes (Fluminense); Formiga (Paulistano), Neco (Corinthians), Arthur Friedenreich (Paulistano), Tatu (Corinthians) e Rodrigues (Corinthians).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Laís
Chile: Guillermo Bernal (Jorge V), Pedro Vergara (Eleuterio Ramirez) e Ulises Poirrier (La Cruz); Humberto Elgueta (Gold Cross), Carlos Catalán (Fabrica de Vidrios) e Tránsito González (La Cruz); Enrique Abello (Magallanes), Aurelio Domínguez (Artillero de Costa), Manuel Bravo (Coquimbo), Luis Encina (Norteamérica) e Víctor Varas (Artillero de Costa).
Téc: Juan Bertone


24/09/1922 - BRASIL 1 x 1 PARAGUAI
Campeonato Sul-Americano - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Gols: Amílcar (14'1T) e Gerardo Rivas (26'2T)

Brasil: Marcos Carneiro de Mendonça (Fluminense), Palamone (Botafogo) e Barthô (A.A. São Bento); Laís (Fluminense), Amílcar (Corinthians) e Fortes (Fluminense); Formiga (Paulistano), Neco (Corinthians), Heitor Domingues (Palestra Itália/SP), Tatu (Corinthians) e Junqueira (Flamengo).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Laís
Paraguai: Modesto Denis (Nacional), César Mena Porta (Olimpia) e Venancio Paredes (Guarani); Roque Centurión Miranda (Guaraní), Manuel Fleitas Solich (Nacional) e Ranulfo Benítez (Libertad); Luciano Capdevilla (Cerro Porteño), Ceferino Ramírez (Nacional), Ildefonso López (Guarani), Gerardo Rivas (Libertad) e Enrique Erico (Nacional).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Ildefonso López


01/10/1922 - BRASIL 0 x 0 URUGUAI
Campeonato Sul-Americano - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro

Brasil: Kuntz (Flamengo), Palamone (Botafogo) e Barthô (A.A. São Bento); Laís (Fluminense), Amílcar (Corinthians) e Fortes (Fluminense); Formiga (Paulistano), Neco (Corinthians), Arthur Friedenreich (Paulistano), Tatu (Corinthians) e Rodrigues (Corinthians).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Laís
Uruguai: Fausto Batignani (Liverpool), Antonio Urdinarán (Nacional) e Domingo Tejera (Montevideo Wanderers); Antonio Aguerre (Liverpool), Alfredo Zibechi (Nacional) e José Vanzzino (Nacional); Pascual Somma (Nacional), Juan Carlos Heguy (Central Español), Ángel Romano (Nacional), Norberto Casanello (Montevideo Wanderers) e Rodolfo Marán (Nacional).
Téc: Pedro Olivieiri


15/10/1922 - BRASIL 2 x 0 ARGENTINA
Campeonato Sul-Americano - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Gols: Neco (42'1T) e Amílcar (41'2T)

Brasil: Kuntz (Flamengo), Palamone (Botafogo) e Barthô (A.A. São Bento); Laís (Fluminense), Amílcar (Corinthians) e Fortes (Fluminense); Formiga (Paulistano), Neco (Corinthians), Heitor Domingues (Palestra Itália/SP), Tatu (Corinthians) e Rodrigues (Corinthians).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Laís
Argentina: Américo Tesoriere (Boca Juniors), Adolfo Celli (Newell's Old Boys) e Florencio Sarasíbar (Rosario Central); Alfredo Chabrolin (Newell's Old Boys), Ángel Médici (Boca Juniors) e Emilio Solari (Nueva Chicago); José Gaslini (Alvear), Julio Libonatti (Newell's Old Boys), Ángel Chiessa (Huracán), Juan Francia (Rosario Central) e Julio Rivet (Del Plata).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico)


22/10/1922 - BRASIL 2 x 1 ARGENTINA
Copa Roca - Parque Antarctica, São Paulo
Gols: Francia (17'1T) e Gambarotta (10'2T) e (25'2T)

Brasil: Mesquita (Portuguesa de Desportos), Grané (Corinthians de Jundiaí) e Clodô (Paulistano); Abatte (Paulistano), Faragassi (Ypiranga) e Nesi (São Cristóvão); Zezé (Fluminense), Leite de Castro (Botafogo), Gambarotta (Corinthians), Tepet (Ypiranga) e Osses (Ypiranga).
Téc: Ferreira Vianna
Argentina: Américo Tesoriere (Boca Juniors), Adolfo Celli (Newell's Old Boys) e Pedro Castoldi (Sportivo Barracas); Alfredo Chabrolin (Newell's Old Boys), Ángel Médici (Boca Juniors) e Emilio Solari (Nueva Chicago); Julio Rivet (Del Plata), Ángel Chiessa (Huracán), José Gaslini (Alvear), Juan Francia (Rosario Central) e Marcelo De Césari (Boca Juniors).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico)


22/10/1922 - BRASIL 3 x 0 PARAGUAI
Campeonato Sul-Americano - Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Gols: Neco (11'1T), Formiga (3'2T) e (44'2T)

Brasil: Kuntz (Flamengo), Palamone (Botafogo) e Barthô (A.A. São Bento); Laís (Fluminense), Amílcar (Corinthians) e Fortes (Fluminense); Formiga (Paulistano), Neco (Corinthians), Heitor Domingues (Palestra Itália/SP), Tatu (Corinthians) e Rodrigues (Corinthians).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Laís
Paraguai: Modesto Denis (Nacional), Venancio Paredes (Guarani) e Ramonete (Atlantida); Roque Centurión Miranda (Guaranoi) Manuel Fleitas Solich (Nacional) e Ranulfo Benítez (Libertad). Daniel Schaerer (Olimpia), Luciano Capdevilla (Cerro Porteño), Ildefonso López (Guarani), Gerardo Rivas (Libertad) e Luis Fretes (Guarani).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Ildefonso López


29/10/1922 - BRASIL 3 x 1 PARAGUAI
Taça Rodrigues Alves - Campo da Floresta, São Paulo
Gols: Imparatinho (2), Gambarotta e Luis Fretes

Brasil: Mesquita (Portuguesa de Desportos), Palamone (Botafogo) e Alexy (A.A. das Palmeiras); Alfredinho (Botafogo), Xingô (Palestra Itália/SP) e Nesi (São Cristóvão); Zezé (Fluminense), Neco (Corinthians), Gambarotta (Corinthians), Imparatinho (Palestra Itália/SP) e Martinelli (Palestra Itália/SP).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Laís
Paraguai: Modesto Denis (Nacional), César Mena Porta (Olimpia) e Ramonete (Atlantida); Roque Centurión Miranda (Guarani), Manuel Fleitas Solich (Nacional) e Ranulfo Benítez (Libertad); Daniel Schaerer (Olimpia), Luciano Capdevilla (Cerro Porteño), Ildefonso López (Guarani), Gerardo Rivas (Libertad) e Luis Fretes (Guarani).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Ildefonso López


Heitor Domingues, Marcos Carneiro de Mendonça e Amílcar Barbuy 


RESUMO:

Seleção Brasileira de 1922:
Kuntz (Flamengo), Palamone (Botafogo) e Barthô (A.A. São Bento/SP); Laís (Fluminense), Amílcar (Corinthians) e Fortes (Fluminense); Formiga (Paulistano), Neco (Corinthians), Heitor Domingues (Palestra Itália/SP), Tatu (Corinthians) e Rodrigues (Corinthians).

Artilharia: Gambarotta (3), Neco (2), Amílcar (2), Formiga (2), Imparatinho (2) e Tatu (1)

Participação:
7 jogos: --
6 jogos: Palamone e Neco
5 jogos: Barthô, Laís, Amílcar Barbuy, Fortes, Formiga,  e Tatu
4 jogos: Rodrigues
3 jogos: Kuntz e Heitor Domingues
2 jogos: Marcos Carneiro de Mendonça, Mesquita, Nesi, Zezé, Gambarotta e Friedenreich
1 jogo: Grané, Alexy, Clodô, Alfredinho, Abatte, Xingô, Faragassi, Leite de Castro, Imparatinho, Tepet, Osses, Martinelli e Junqueira


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