Em 1920 a história da Seleção Brasileira começou a ser prejudicada por problemas políticos internos do país. Para o Sul-Americano que viria a ser jogado no Chile, o Brasil foi representado praticamente por uma Seleção Carioca (do Rio de Janeiro) reforçada por dois jogadores do Santos e um do Brasil de Pelotas, do Rio Grande do Sul (o primeiro de fora do eixo Rio-São Paulo a vestir à camisa da Seleção Brasileira). Um outro marco: pela primeira vez a seleção foi comandada efetivamente por um técnico e não por um comitê liderado por um de seus jogadores. O treinador foi Oswaldo Gomes, um ex-jogador da própria seleção.
O imbróglio político se deu por um problema entre a Confederação Brasileira e a Federação Paulista, o qual levou a que os clubes de São Paulo não liberassem seus jogadores para disputar o Campeonato Sul-Americano de 1920 com a Seleção Brasileira. A desavença foi causada pela marcação da data de realização do tradicional confronto entre os clubes campeões do Campeonato Carioca e do Campeonato Paulista (então chamada Taça Ioduran). Assim, o time do Brasil foi ao Chile bastante desfalcado.
Com a organização da competição continental daquele ano sendo no Chile, com o torneio ainda restrito à participação de Argentina, Brasil, Chile e Uruguai, encerrou-se um ciclo de quatro edições do torneio nas quais cada um foi uma vez a sede da competição. Os uruguaios voltaram a conquistar o título naquele ano, assim nestas 4 primeiras edições houve 3 títulos do Uruguai e 1 do Brasil.
A Seleção Brasileira terminou a 1ª rodada do triangular na liderança após ter vencido ao Chile e visto Argentina e Uruguai empatarem. Mas na 2ª rodada, uma goleada acachapante (6 a 0) dos uruguaios para cima dos brasileiros, acabaria com qualquer aspiração do Brasil. Na mesma rodada, a Argentina tropeçou ao empatar contra os anfitriões. Assim, na última rodada, bastou à camisa celeste vencer aos chilenos para assim conquistar a seu terceiro título, com os argentinos superando aos brasileiros e ficando com a segunda colocação.
Como curiosidade histórica, a terrível goleada sofrida em 18 de setembro de 1920 para o Uruguai por 6 x 0 perduraria até 2014 como a pior derrota sofrida pela Seleção Brasileira em sua história.
Foi em 1920 também que houve o primeiro registro de manifestações preconceituosas de argentinos contra brasileiros. Na volta do Sul-Americano realizado no Chile, a delegação brasileira parou em Buenos Aires, onde foi programado um jogo amistoso entre Brasil e Argentina. A viagem era longa, de navio, o que forçava paradas para manutenção da embarcação. Durante esta estadia brasileira em Buenos Aires, o jornal argentino "La Crítica" inaugurou oficialmente a expressão "Macaquitos", termo preconceituoso usado pelos argentinos pejorativamente em relação aos brasileiros.
O citado jornal publicou uma charge com o desenho de macacos trajando o uniforme da Seleção Brasileira sob o título: "Macacos em Buenos Aires. Uma saudação aos ilustres hóspedes". Em protesto contra a charge, vários jogadores brasileiros se recusaram a entrar em campo para a disputa do amistoso. Só 7 jogadores brasileiros se apresentaram para a partida. Decidiu-se então colocar quatro jogadores argentinos (Baigorri, Antonio Rosado, Emilio Solari e Castro) para completar os onze do time brasileiro. Com esta atitude, a torcida local protestou com vaias e objetos arremessados para dentro do campo de jogo, e a partida foi interrompida. Para que houvesse continuidade e se evitasse protestos ainda piores, decidiu-se continuar a partida com 7 jogadores de cada lado. Esta partida de 6 de outubro terminou 3 a 1 para a Argentina, entretanto, nunca foi considerada por nenhuma das confederações dos dois países na lista de confrontos históricos Brasil vs Argentina.
A Seleção Brasileira que jogava futebol em 1920 e sofreu tal ataque com a capa do jornal de Buenos Aires era formada por jovens ricos e de tom de pele não tão distinto do argentino, mas com presença, inquestionavelmente, de uma maior mestiçagem do que a observada entre os jogadores representantes do país vizinho.
Assim, ainda que só tendo jogado três partidas em 1920, foi um ano de marco histórico para o futebol brasileiro, que viu crescer a rivalidade interna entre a capital federal Rio de Janeiro com a província mais rica São Paulo, viu eclodir a rivalidade externa com aquele que veio a se tornar o seu principal rival no continente, a Argentina, e veio a sofrer a derrota que perduraria por 94 anos como a pior da história da Seleção Brasileira, até ser superada pelo fatídico 7 a 1 da Copa do Mundo de 2014.
JOGOS NO ANO:
11/09/1920 - BRASIL 1 x 0 CHILE
Campeonato Sul-Americano - Valparaíso Sporting Club, Viña del Mar, Chile
Gol: Alvariza (34'1T)
Brasil: Kuntz (Flamengo), De Maria (Andarahy) e Martins (São Cristóvão); Rodrigo Brandão (Flamengo), Sisson (Flamengo) e Fortes (Fluminense); Zezé (Fluminense), Constantino (Santos), Castelhano (Santos), Junqueira (Flamengo) e Alvariza (Brasil de Pelotas).
Téc: Oswaldo Gomes
Chile: Manuel Guerrero (La Cruz), Pedro Vergara (Santiago Wanderers) e Ulises Poirrier (La Cruz); Víctor Toro (Union Atletico), Humberto Elgueta (Gold Cross) e Ramón Unzaga (Estrella del Mar); Víctor Varas (Artillero de Costa), Aurelio Domínguez (Artillero de Costa), Blas Parra (Artillero de Costa), Alfredo France (Gold Cross) e Horacio Muñoz (Fernández Vial).
Téc: Juan Bertone
Brasil vs Chile
18/09/1920 - BRASIL 0 x 6 URUGUAI
Campeonato Sul-Americano - Valparaíso Sporting Club, Viña del Mar, Chile
Gols: Ángel Romano (23'1T), Urdinarán (26'1), José Pérez (29'1T), Campolo (3'2T), Ángel Romano (15'2T) e José Pérez (20'2T)
Brasil: Kuntz (Flamengo), Telefone (Flamengo) e Martins (São Cristóvão); Japonês (Flamengo), Sisson (Flamengo) e Fortes (Fluminense); Zezé (Fluminense), De Maria (Andarahy), Castelhano (Santos), Junqueira (Flamengo) e Alvariza (Brasil de Pelotas).
Téc: Oswaldo Gomes
Uruguai: Juan Legnazzi (Peñarol), Antonio Urdinarán (Nacional) e Alfredo Foglino (Nacional); Pascual Ruotta (Peñarol), Alfredo Zibechi (Nacional) e Andrés Ravera (Peñarol); Pascual Somma (Nacional), José Pérez (Peñarol), José Piendibene (Peñarol), Ángel Romano (Nacional) e Antonio Cámpolo (Peñarol).
Téc: Ernesto Fígoli
25/09/1920 - BRASIL 0 x 2 ARGENTINA
Campeonato Sul-Americano - Valparaíso Sporting Club, Viña del Mar, Chile
Gols: Echeverría (40'1T) e Libonatti (28'2T)
Brasil: Kuntz (Flamengo), Telefone (Flamengo) e Martins (São Cristóvão); Japonês (Flamengo), Sisson (Flamengo) e Fortes (Fluminense); Zezé (Fluminense), Constantino (Santos), Castelhano (Santos), Junqueira (Flamengo) e Alvariza (Brasil de Pelotas).
Téc: Oswaldo Gomes
Argentina: Américo Tesoriere (Boca Juniors), Antonio Cortella (Boca Juniors) e Florindo Bearzotti (Belgrano); Ángel Frumento (Banfield), Juan Salvador Presta (Porteño) e Rodolfo Bruzzone (Palermo); Pedro Calomino (Boca Juniors), Julio Libonatti (Newell's Old Boys), Atilio Badalini (Newell's Old Boys), Raúl Echeverría (Estudiantes) e Antonio de Miguel (Newell's Old Boys).
Téc: Ground Committee (Comitê Técnico) comandado por Pedro Calomino
RESUMO:
Seleção Brasileira de 1920:
Kuntz (Flamengo), Telefone (Flamengo) e Martins (São Cristóvão/RJ); Japonês (Flamengo), Sisson (Flamengo) e Fortes (Fluminense); Zezé (Fluminense), Constantino (Santos), Castelhano (Santos), Junqueira (Flamengo) e Alvariza (Brasil de Pelotas).
Artilharia: Alvariza (1)
Participação:
3 jogos: Kuntz, Martins, Sisson, Fortes, Zezé, Castelhano, Junqueira e Alvariza
2 jogos: Telefone, De Maria, Japonês e Constantino
1 jogo: Rodrigo Brandão
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